[Por que desprezam os Governos a Educação, associada à importância da Saúde – (do Latim-, “salvação”)]...
Nota Prévia: Artigo com 25 anos, devidamente actualizado em 2021, publicado na Revista “ENTRE TANTO”, órgão da Administração Regional de Saúde do Norte (Portugal), n.º 5, em Dezembro de 1996.
Quando equacionamos questões como a da Educação, se quisermos que a mesma sirva os objectivos para os quais se perspectiva, isto é, a formação equilibrada e integral das gerações futuras, torna-se fundamental manter presente que qualquer Sistema Educativo, nos paízes ditos civilizados, terá necessariamente de ser um exemplo vivo de excelência e aprumo.
Estas qualidades terão de ser asseguradas, não só pelos diversos actores em presença, mas também pelo Ministério respectivo, em estreita relação de cooperação com outros Ministérios, como o da Saúde e o das Finanças, visando a harmoniosa acção educacional das (nas) sociedades em causa.
Desta forma, os custos seriam contabilizados enquanto investimentos e não, como acontece em Portugal, onde a mentalidade redutora dos sucessivos governos tem encarado a Educação como um sector onde o dinheiro é, simples e grosseiramente, gasto.
Recordemos tambem que o conceito de Comunidade Educativa só tem razão de ser se o mesmo for representado como algo dinâmico, ventilado, edificante, que interage simbioticamente através dos vários interlocutores que lhe dão corpo; estes são, evidentemente, os professores e os alunos (relação ensino/aprendizagem, de cariz primordial); os vários agentes de desempenho coadjuvante (com formação específica e competências devidas para apoiar a dinâmica do quotidiano das escolas); as equipas de Saúde, sobre as quais discerniremos mais à frente.
Trata-se, portanto, de uma Comunidade bastante alargada, onde convivem todas as fases etárias e sexos; todos os níveis sociais; que utiliza espaços diversos; que corre riscos vários e que, como facilmente se depreende, não pode dispensar as mais elementares prestações da medicina pedagógica, das vacinações e dos cuidados de saúde primários.
O DO(C)ENTE EM RISCO
Decorria o ano de 1987, quando nos foi dado a redigir um artigo para a Revista “CARTILHA”, n.º 0 (zero), subordinado ao título: “Professor, Profissão de Alto Risco” (e acrescentamos nós agora – “Desgaste Rápido e Remuneração Simbólica”.
O que na altura afirmámos sobre esta matéria, teve em conta a definição que a Organização Mundial da Saúde apresentou para o conceito “saúde” – do Latim, “salvação”. Quer dizer, esta não é apenas a ausência de doença, mas implica, sobremaneira, o bem-estar físico, psíquico e social (familiar, profissional e comunitário).
Nesta medida, depois de tecida uma série de considerações sobre a realidade da vida docente e sobre a multiplicidade dos riscos que a mesma comporta, tivémos de reconhecer que, para além dos omnipresentes problemas profissionais, muma classe, à época, maioritariamente constituída por mulheres (78,5%), de quem a natureza e a sociedade mais exigem, acrescem atribuições de carácter maternal e doméstico... Sim, sim, ainda hoje é assim!!! Não é de espantar, portanto, que, na maioria dos casos, os professores se vejam obrigados, amiúde, a recorrer ao médico (clínico geral, especialista ou psiquiatra).
Viríamos, então, a concluir o trabalho a que se alude, demonstrando que ser professor era (e continua a ser cada vez mais) estar exposto a um sem número de riscos e patologias que – dissémo-lo no momento –, “(...) deverão constar do próximo Estatuto Docente, como doenças profissionais devidamente tipificadas, merecendo das autoridades medidas concretas quanto ao tratamento e à cura, e bem ainda beneficiar das compensações necessárias, quando provoquem deformidades, incapacidades físicas, mentais ou de outra ordem”.
Escusado será dizer que a nossa chamada de atenção caiu em saco roto... Hoje, prestes a ter início o ano lectivo de 2021/2022, as coisa vão de mal a pior! Diga-se, no entanto, em abono da verdade, terem sido consideradas “doenças incapacitantes”, para efeitos do N.º 1 do Artigo 48.º do Dec. Lei N.º 497/88 de 30 de Dezembro, um conjunto de 18 (dezoito) enfermidades, entre as quais a sarcoidose, os tumores malignos, as hemopatias graves, a hipertensão arterial maligna, as cardiomiopatias graves, a espondilite anquilosante, etc....
Passados que foram largos meses, foi com surpresa e desolação que, ao analisarmos o Decreto-Lei N.º 139-A/90 de 28 de Abril, documento baptizado com a designação de Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, constatámos que as graves patologias, enfermidades e desequilíbrios induzidos pela prática docente tinham sido ignorados pelo legislador. Mas, já depois do regabofe-rosa, do pântano guterrista e dos jobs for the boys, tudo isto viria a piorar drasticamente, a partir de 2005, na vigência da dupla Sócrates/Lurdes Rodrigues: viriam a impor, em 2007, um estatuto docente humilhante que revogaria o anterior; depois, com Passos Coelho, e, depois ainda, com Costa, foi reiterada a destruição do prestígio social e a auto-estima dos professores. Estaremos à beira de embrutecer a população discente?!!! Fica no ar a questão.
E que tal implementar a aplicação de um dispositivo legal de contemplação e atendimento do do(c)ente, a exemplo do que se verifica no caso da tuberculose e no género do que se observa no sector privado? Para que serve a ADSE tornada imposto?!...
Impõe-se, desde já, um Estatuto voltado para o futuro, capaz de contemplar todos os aspectos já referidos para reabilitação da imagem social do professor, sem esquecer o Alto Risco e o Desgaste Rápido e as doenças que estas duas vertentes potenciam no dia-a-dia lectivo.
A População Estudantil
Dentre todos os actores da Comunidade Educativa, os alunos constituem o grupo mais numeroso e não menos importante. As crianças e os jovens escolarizados, conforme o ciclo que frequentam, enquadram-se em fases etárias distintas, a impor cuidados de saúde diversos. É de reter ainda, ter a massificação do ensino atirado para as escolas, também, as crianças dos sectores económico-sociais mais degradados, merecendo-nos estas a melhor das atenções, por razões óbvias.
Nesta conformidade, e reportando-nos à experiência e/ou conhecimentos colhidos nas escolas das grandes cidades do nosso país, somos levados a propor a instalação, em todas elas, de três gabinetes, a saber: um de Educação Especial; outro de Serviço de Psicologia e Orientação Escolar; um terceiro de Medicina Pedagógica e Cuidados de Saúde Primários e Vacinação, claro, em instalações compartimentadas.
Para trabalhar nos gabinetes referidos teria o Governo (as Tutelas respectivas, devidamente articuladas) de recrutar, respectivamente, professores especializados, psicólogos e assistentes sociais, pediatras, clínicos generalistas e enfermeiros.
O Sistema Educativo apostaria, já hoje (escrevíamos em 1996), na saúde dos seus estudantes, mantendo sob controlo e tratamento as vacinações, as subnutrições, as inadaptações, as neuropatias, os atrasos mentais, etc., os entorses, os golpes, as fracturas, os hematomas, etc., etc..
CONCLUSÃO
Se se pretende fomentar, nas nossas escolas, um clima pedagogicamente equilibrado, vamos já agarrar a saúde com ambas as mãos, através das medidas aventadas ao longo do presente escrito. Reduzam-se as turmas para um número máximo de 12 (doze) alunos; assegure-se a estabilidade profissional dos professores contratados; qualifiquem-se os funcionários que designámos por “Agentes de Desempenho Coadjuvante”; construam-se escolas de acordo com as reais necessidades das comunidades que deveriam servir; atribuam-lhes autonomia financeira, pedagógica e administrativa; reduzam a carga horária e aumentem os períodos intercalares de interrupção lectiva; permitam a criação de um currículo na própria escola (“A Construção do Currículo na Escola”*), de forma a que se adeque a cada uma das realidades em presença.
Vamos, enfim, dar um novo fôlego à Educação, também com o contributo indispensável da SAÚDE e dos seus profissionais, prevenindo a hecatombe educacional.
*Em 1994 publicámos, em co-autoria com Luísa Alonso et al, o livro “A Construção do Currículo na Escola” (n.º 5 da Colecção Básica da Porto Editora). Porto.
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