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Com o 25 de Abril ocorrido há
já pouco menos de meio século, achamos por bem redigir
algo sobre os políticos e a habilidosa arte de fazer política,
tal e qual se passa, as mais das vezes, no circo da vida, no circo
dos nossos convencimentos pessoais, no circo, enfim, das mais
elementares relações que levam cada um de nós a manter
com o outro determinado tipo de contacto, dependência ou
ascendência.
Sempre se urdiu, a este nível,
uma complexa teia de relações, mais ou menos profundas,
entre a arte e a política, e vice-versa, sendo mesmo de
considerar, a política em si, como uma manifesta exibição
artística que aprimora o convencimento e a condução
das massas, antes mesmo da prática performante da governação
dos estados. É que sem aquela não se chega a esta.
A política, no entanto, tem
sido já vista também como a precipitada consumação
de um conjunto de atitudes de lesa-arte, tendo em conta a
inconsequente imprevisibilidade da sua acção no
terreno, como nos testemunham, a título de exemplo, muito
recentemente, as ocorrências verificadas no museu de Bagdad.
Tal facto, está bem de ver, legitima a pertinência do debate
sobre a presença da política na arte.
Se quisermos, não há
quem nos possa impedir de olharmos a natureza virgem como um imenso
painel artístico que, despudoradamente, os políticos,
por incompetência, ligeireza ou fraqueza mental, não têm
sido capazes de preservar, em prol do interesse dos países.
Contemporaneamente, tanto a história
da arte como a história da cultura perpassam face à nossa
inteligibilidade como fazendo parte do devir civilizacional,
consideradas no quadro das suas diversas nuances. De acordo com
Wolfflin (1864-1945), habituámo-nos a fazer do passado uma leitura que empresta
supremacia à evolução da forma na arte, em
detrimento da época histórica. Constata-se hoje, porque
disso nos damos conta, a par e passo, que “quem conta um conto,
acrescenta-lhe um ponto”, conforme acautela o anexim popular, por
isso, e porque dos fracos – leia-se – dos vencidos não
reza a história, importa sobretudo perceber a contextualização
dos factos, para que os mesmos se tornem história, enquanto
relato criteriosamente decalcado da realidade factual. Assim, a
integração social da obra de arte, ainda que
considerando o período romântico como que imbuído
de um claro clima de fuga, de “exclusão”, de grito de
“liberdade artística”, não passa, quer se queira
quer não, de uma independência politicamente moldada
pelas alterações sociais e tecnológicas a que o
artista estava irremediavelmente sujeito.
Embora Mikel Dufrenne (1910-1995) tivesse
vaticinado o “fim da arte” e tenham surgido “outras artes
radicalmente diferentes”, muito se escreveu, debateu e especulou
sobre questões ligadas à “arte pela arte” em
contraponto com a “arte com mensagem”... crítica. Não
raro, os escritos comportam conteúdos que não são
maniqueístas e, tanto faz que nos coloquemos face aos
formalistas, à frente dos quais se apresenta Clement
Greenberg (1909-1994), como sigamos atentamente a filosofia em que assenta a
estética marxista e a sua “arte para todos”, para
rapidamente concluirmos que a arte se mescla com a política,
tanto quanto com o poder eclesiástico ou com o poder
governativo em geral, sendo mesmo ténue ou até
imperceptível a fronteira que se esboça, ou não, entre uns e outros.
Exemplos eloquentes desta
indissociável sobreposição, quantas vezes
estratégica, contam-se nos inúmeros símbolos
artísticos, quantas vezes monumentais, postados na frente dos
edifícios institucionais; recordam-se os quadros e os retratos
dos reis, dos chefes, dos presidentes, imperadores e governantes, nos
quatro cantos dos seus respectivos domínios; passam-nos pela
mãos, diariamente, as moedas com as suas caras... ontem como
hoje, desde a Roma imperial até aos regimes totalitários que
fizeram vergar a Europa durante a primeira metade do século
vinte.
A arte, ao ligar-se de forma tão
estreita com a política, bifurca-se entre o serviço que
pode prestar ao poder e a sombra que lhe pode fazer, seja qual for o
regime que tomemos como exemplo – democrático ou
totalitário. Estamos perante uma forma de expressão
artística reactiva, com intenção social, que
opera numa base de desconstrução e radicalização
de conceitos do “mundo da arte” especialmente, e da sociedade em
geral, quando se decide pela contestação. Esta,
“critica autocriticando o sistema no qual se integra,
metamorfoseando-se com outros sistemas exteriores ao artístico”.
O circo da política reveste uma
multiplicidade de nuances artísticas, através do
desfile colorido do cortejo reactivo de analogias que adquirem formas
bizarras, nas atitudes e comportamentos dos seus protagonistas ou,
tão-só, devido à subtil arte de passar
despercebido, quanto tal se impõe, de se omitir, quando tal é
“necessário”, de recriar Pilatos, mesmo quando,
manifestamente, lavar as mãos não chega.
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