terça-feira, 27 de março de 2018

AFECTOS



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Na busca desse cheiro tão diverso
das imagens vividas no passado
dou por mim sem saber do controverso
endosso de tal vulto simulado

Aroma como esse tão disperso
Erra agora perdido como um brado
sofrido suplicante e sem reverso
ou tão-só denso firme e idolatrado

No dorso dum corcel de vento agreste
vislumbram-se perfumes de sentidos
desfiando uma lascívia celeste

impudente nos gestos desabridos
matizando o poema que me deste
de fragrantes afectos divididos

Em 25-03-2018 -- M. B. S.

quinta-feira, 15 de março de 2018

HEGEMONIA, PREPOTÊNCIA E PERSECUÇÃO




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            A propósito do escrito “Pensar a Humanidade”, publicado neste mesmo espaço, fomos movidos pelo inelutável impulso de reler a excelente e abrangente obra de Darcy Ribeiro, O POVO BRASILEIRO – A Formação e o Sentido do Brasil. Esta publicação (2.ª edição) foi dada à estampa pela editora Companhia das Letras, em São Paulo, em 1995. Trata-se do resultado final de uma tão árdua quanto bem intencionada tarefa de investigação, que Ribeiro nos apresenta de forma honesta e desassombrada, não só porque respeita historicamente as múltiplas fontes fidedignas a que recorreu, mas também porque o faz sem se deixar levar pela óptica unilateral do colonizador.

            Da nossa perspectiva, que coincide com a abordagem de Ribeiro, o homem continua a se degladiar e, portanto, a não se entender – e aqui faz todo o sentido o teor da reflexão “Pensar a Humanidade” –, porque aquele continua, como sempre aconteceu, a dar livre curso aos seus instintos primários (princípio do prazer), ao invés de agir civilizadamente (princípio da realidade), muito embora tenha classificado (hipocritamente) de acção civilizacional (?!) [intrusões na África, Ásia, América e Oceania, a partir do séc. XIV], todo o conjunto de ocupações, agressões, usurpações, sequestros, dominações, torturas e atrocidades, logo seguidas de escravização organizada, de trabalho forçado, de saque sistemático de matérias-primas, de descaracterização e caotização da coesão tribal, tendo rematado a sua “notável” acção civilizadora, exaurindo as comunidades autóctones, através do imparável tráfico negreiro para fora de África.

            Sim, o pretexto foi a alegada atitude civilizadora; a motivação foi a ganância que a bancarrota europeia acicatou. É claro que, ao longo de toda a História da Humanidade, até ao séc. XIV – e logo que a forma de organização das comunidades deixou de ser matriarcal e passou a ser patriarcal... não cabe aqui e agora discernir sobre este particular –, o conceito de racismo não possuía ainda o subsequente referente extra-linguístico real, embora existisse. Acontecia quando se registavam conflitos de interesses, seguidos das inevitáveis guerras e mortandades e, no fim, o resultado era sempre o mesmo: os vencedores apoderavam-se do espólio dos derrotados, dos seus territórios e, quando não os matavam, tornavam-nos escravos. Por racismo?!... Não, tal como o passámos a conceber depois da ocupação do continente africano e nos séculos seguintes!... Tudo era tácito ou inevitável, se quiserem, devido ao poder do mais forte, à hegemonia dominadora, à ascendência da dinâmica verificada.

            Particularmente, entre os séculos XV e XVII, a Europa viria a conseguir desenvolvimentos técnicos consideráveis para a época, o que reforçaria a sua capacidade hegemónica de dominação e imposição dos seus arbítrios e interesses junto de outras paragens onde a vida tinha, até aí, decorrido na-tu-ral-men-te. As populações autóctones (caçadoras-recolectoras) passaram a ser olhadas como presas fáceis, isto é, teriam de se submeter ao papel laboral que o colonizador lhes destinou, sem direito de opção, sem liberdade de escolha. Tudo isto devido ao incrível desfasamento existente entre o efectivo apuro e progresso tecnológico do Ocidente, quando comparado com a pureza do status tribal das comunidades indígenas. Não havia como bater o pé, negar ou tentar resistir; contra a prepotência e o primitivismo ataviado não há argumentos... Ainda hoje é assim!

Bibliografia: SANTOS, Manuel Bragança dos, A Paixão e Ressurreição do Soldado (2014), Versbrava Editora, Porto.

           

PENSAR A HUMANIDADE



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       Em Novembro de 2016, referimos aqui a obra “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, de Immanuel Kant (1724-1804), para sublinhar a legitimidade que este filósofo subscreve, sempre que as interacções humanas que visam a concretização dos projectos de vida e dos interesses de cada indivíduo respeitem os direitos dos outros e a sua dignidade humana. Em Março de 2017, e face a esta matéria, apontámos um conjunto de contradições inerentes ao comportamento humano, no âmbito social, tendo recorrido aos ensinamentos de Goleman (2006), Hell (2009), Damásio (2013) e Mlodinow (2014), nomeadamente quando estes cientistas falam do mesencéfalo do homem, na zona média cerebral, com diencéfalo (tálamo e hipotálamo)cérebro reptílico, regulador das funções vitais básicas, como nos répteis –; e córtex cingulado no topo envolvente – sistema límbico, onde se alocam os sentimentos ou afectos primários dos primeiros mamíferos. Fixemos isto!

            Mais recentemente, e segundo os mesmos autores, constituiu-se o neo-córtexsede das funções cognitivo-afectivas superiores complexas, capazes de pensamento e linguagem e de diferenciar emoções. Correcto! O facto é que não deixámos de possuir cérebro reptílico com tudo o que isso implica de carga ancestral dinâmica, a determinar em cada um de nós uma matização caracterológica tripartida, a dar corpo à ambição, à territorialidade e à agressividade... tal como nos répteis! Mas, para disciplinar o instinto e promover a cultura, impõe-se a Educação a partir do berço, que deve ser, de resto, a principal e a mais empenhada tarefa familiar e sóciocultural?! Pois é! Tem vindo a ser descurada.

            Para Pires, Fernandes e Formosinho (1991), docentes na Universidade do Minho, “(...) Cultura é tudo aquilo que não é instintivo”. Já Almada Negreiros (1893-1970), a este respeito, tinha afirmado que “Cultura é tudo quanto permanece depois de tudo ter sido esquecido” (Sarmento, 1994: 68). Tudo isto significa, portanto, que o homem tenderá a viver nesta dilemática situação: ou, por um lado, dá mais importância à Educação e às aprendizagens com sentido, para poder respeitar a dignidade do seu semelhante, tirando partido das capacidades hominizadoras do neo-córtex, ou, por outro lado, continuará a se deixar levar pela sua caracterologia meramente reptílica.

            Porém, como toda esta problemática não reveste nenhum tipo de linearidade, nem a montante nem a jusante, encontrámos sempre no passado, em termos histórico-filosóficos, e deparamos também hoje, e quiçá no futuro, não só quem se preocupou, preocupa ou preocupará com os direitos dos outros, mas também quem tirou, tira ou tirará partido da ingenuidade, fragilidade ou ignorância dos deserdados, indigentes, vulneráveis, tecnologicamente deficitários, económico-financeiramente falidos (países ou pessoas), para granjear vantagens (ilícitas) de todo o tipo. No primeiro caso, os bem-(in)formados; no segundo, os mal-(in)formados. Poderão, no entanto, ocorrer regenerações ou deslizes; mais estes do que aqueles, mas nada nos faz crer que o princípio da realidade possa dispensar a Educação Sistémica dos seres humanos.        

Bibliografia: Damásio, A. (2013). O Sentimento de Si – Corpo, Emoção E Consciência. Temas e Debates. Círculo de Leitores. Lisboa.
                    Goleman, D. (2006). Inteligência Emocional. Espanha: RevistaSábado.
                    Hell D. (2009). Depressão – Que sentido faz? Sete Caminhos. Lisboa.
                    Mlodinow L. (2014). Subliminar – Como o Inconsciente Controla o Nosso Comportamento. Lisboa: Marcador Editora.
                    Sarmento, M. J. (1994). A Vez e a Voz dos Professores – Contributo para o Estudo da Cultura Organizacional da Escola Primária. Porto Editora. Porto.