segunda-feira, 30 de setembro de 2019

FIQUEMO-NOS


                 Fiquemo-nos pelas evocações
                 num apelo capaz de comportar
                 a partir das cinzas sem soluções
                 o nulo passível de concentrar

                 caminhos ausentes das dimensões
                 tão-só sonhadas ou por mascarar
                 dos vagos rumos das imprecisões
                 já sem futuro nem caução solar

                 Fiquemo-nos talvez pelo presente
                 na fuga dos fantasmas do passado
                 na rota que se refracta demente

                 na dolorosa presença do fado
                 contido no passado recorrente
                 descrente do futuro ali ao lado
Nota: Imagem do Google

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

OS FILHOS TÊM DE SER MERECIDOS



   O nascimento de uma nova vida humana constitui sempre um trauma, seguramente para a criança. Compete à mãe a tarefa de readaptação da sua nova condição de recém-nascida, através dos seus corpos, integrando-a, o melhor possível, no ambiente familiar, onde a presença do pai e dos irmãos, se os houver, é também crucial. É importante garantir os vínculos necessários, desde logo, para potenciar toda a riqueza inerente ao desenvolvimento infantil.

   A não ser assim, cava-se o fosso do trauma e a vacuidade narcísica; fomenta-se o apagamento emocional; esfuma-se a alegria de viver e de descobrir; engendra-se um quadro de somatização onde está patente o instinto de morte, resultante da angústia da perda do objecto. O psiquismo do sujeito é profundamente abalado, instaurando-se a desordem e a perda da consciência moral e agravam-se as feridas narcísicas.

  Neste tipo de situações (recordamos casos concretos), ocorrem sempre negligências relacionais maternas graves e continuadas, nos cuidados primários e subsequentes, onde a interacção se pauta por uma proximidade parasitária dual de cariz sado-masoquista. Aqui, a criança internaliza apenas a frustração da perda e rejeição que a isola, perturba e confunde. Depois do universo inconsciente dos pais ter pesado sobre a gestação e o nascimento do novo filho, acresce agora o seu comportamento disruptivo.

   Estamos em presença de modelos de vinculação precários e redutores que aniquilam a capacidade de adaptação à família, à escola e ao social, como se a criança tivesse de atravessar um precipício através de uma ponte-rudimentar-sem-grades: mostrar-se-á insegura, apavorada, frustrada, revoltada e ansiosa; correrá o risco eminente, também, ao longo da vida, de sofrer de patologias de cariz neurótico ou psicótico.

   O seu psiquismo tenderá a procurar defesas compensatórias, por sistema, através da denegação e da regressão; do recalcamento e da foraclusão; da clivagem e da identificação projectiva. É a luta desesperada do Ego, na tentativa de aquietar a ferida narcísica e a gestão objectal; de se furtar às malhas da psicose, mas incapaz de evitar as neuroses obsessivas e a variabilidade da sintomatologia psicossomática.



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sábado, 21 de setembro de 2019

SE JÁ NÃO TEMOS TEMPO




                Se já não temos tempo para nada
                por ser o mais do tempo capital
                somos reféns da vida dissipada
                pelo ferrete pós-colonial*

                Dividir a gente dilacerada
                como quem lhe garante o seu bornal
                busca tão-só reinar na balaustrada
                do redondel do circo mais fatal

                Clivar é projectar o que se quer
                libertar do desejo que nos tolhe
                sem tempo nem lugar e sem sequer

                permanecer nas ondas ou no molhe
                como se desfolhar um malmequer
                pudesse ser o fim que nos acolhe

Nota: *pós-colonial = paramodernidade 
Nota 2: imagem do Google



domingo, 15 de setembro de 2019

DINÂMICA JORNALÍSTICA SIGNIFICANTE


   O Homem é um ser eminentemente social, porque possui a capacidade de comunicar. Para isso serve-se da sua competência linguística que, como refere Roman Jakobson (1896-1982), assenta na existência de um código comum que fundamenta essa mesma comunicação (Kristeva, 1969: 25). O esforço comunicacional que veicula o discurso integra, estruturalmente, o emissor e o receptor, verificando-se, por via de regra, o desejo não só do primeiro fazer passar a mensagem ao segundo, mas também a necessidade de exercício de uma certa influência ideológica no mesmo sentido: tal como disse Jaques Lacan (1901-1981), citado por Kristeva (1969: 26), as formas de operar o discurso concreto “são as da história enquanto constituição da emergência da verdade no real”.

Do mesmo modo, o discurso jornalístico é uma forma de linguagem que se concretiza no acto de comunicar, seja ele operacionalizado de forma oral ou escrita. O discurso, os múltiplos discursos, incluindo o jornalístico, apresentam-se-nos, desde que existe a comunicação social, como um autêntico espelho da sociedade, quer nos cheguem sob a forma de discursos políticos, discursos publicitários, discursos filosóficos, quer sob uma outra qualquer forma. Também aqui, uma vez mais, se verifica a reciprocidade de influências entre ambas as partes, isto é, entre a sociedade propriamente dita e os vários discursos e vice-versa.

Quer dizer: é a sociedade que, plasmada no real, fornece enunciados, cuja legibilidade objectiva apresentar-se-á, de uma forma ou de outra, eivada daquela subjectividade inerente ao tipo de leitura que o jornalista, o político, o filósofo ou o cidadão comum possam fazer, de acordo com o seu próprio edifício sócio-cultural e económico, não sendo de somenos importância o contexto ideológico de cariz democrático ou de outro tipo, tal como se deixou antever no primeiro parágafo deste texto, ao referir Julia Kristeva (1941-++++). É que a(s) frase(s) que dá (dão) forma ao discurso, gera(m)-se a partir do enunciado, enquanto conjunto articulado, organizado de palavras com sentido sintagmático, revestindo sempre, de forma voluntária ou não, a já aludida feição ideológica que a mensagem faz transportar.


   Seguidamente, a partir do corpus que congrega o discurso, importa proceder à sua verificação, numa linha de congruência analítica que possa garantir a quem o elabora, o tipo de comentário necessário à posterior elucidação do público ao qual se destina, no âmbito do assunto contemplado. Estamos já perante o discurso jornalístico, ou seja, é esta a matéria que engloba um quantum informativo, susceptível de gerar o comentário que se lhe adequa. Não se pense, no entanto, que um texto constitui, por si só, o discurso jornalístico. Evidentemente que não. Nem tal seria possível. O texto gera sempre outros textos, dando corpo ao discurso com sentido, no âmbito da realidade sistémica global vivida em cada ciclo noticioso diário.


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quarta-feira, 11 de setembro de 2019

A INFORMAÇÃO ONLINE


Com o crescente desenvolvimento das novas tecnologias, o que confere uma nova realidade à forma como se opera a comunicação e a visão que se nos oferece de tudo quanto se passa na “aldeia global”, como lhe chamou Marshall McLuhan, alterou-se também o paradigma comunicacional que, beneficiando da digitalização das práticas jornalísticas, viria a adoptar, ao invés da massificação, a possibilidade de individualização onde a interactividade é pautada pela personalização da informação (Bastos 2010: 1, Amaral 2005: 135).

Na sociedade dos nossos dias, face à introdução do ciberjornalismo, os profissionais da comunicação são levados a experimentar novas atitudes jornalísticas e novas linguagens (escrita e leitura), para poderem enquadrar os novos dispositivos tecnológicos ao seu dispor e retirar deles todas as vantagens que os mesmos conferem à comunicação. Estar online é estar em contacto directo com o utilizador e ser capaz de jogar ao nível da interactivididade, da hipertextualidade, com carácter dinâmico, mas ignorando a pressão do tempo e do espaço como acontecia no jornalismo tradicional.

A interactividade e a hipertextualidade conferem ao jornalismo online algo de novo que o jornalismo tradicional não ousava: com a internet, reconfigurado o novo espaço global mediático, o utilizador acede, através da sua interactividade e pode, a qualquer hora e em qualquer lugar, dispor de informação prática e objectiva, que o jornalista readaptado e sempre actualizado garante com recurso à multimédia e à hipertextualidade integrando várias hiperligações organizadas em rede.

O ciberjornalismo, que utiliza processos interactivos no âmbito da comunicação digital, fomenta interacções mútuas e personalizadas, através do correio electrónico, dos fóruns de discussão, chats, inquéritos e comentários (Amaral 2005: 136/137).

Não obstante as potencialidades já declaradas do jornalismo online, uma coisa é a teoria outra coisa é a prática, nomeadamente no nosso país.

A propósito do jornalismo online em Portugal, António Granado, jornalista e editor do “Público online”, numa curta entrevista com data de 24/11/2007, dá nota de um ciberjornalismo ainda em fase embrionária, quer da parte das empresas jornalísticas, quer no que diz respeito ao entusiasmo dos leitores. Acrescenta também que as universidades não agarraram ainda as potencialidades dos novos media e que se encontram desactualizadas na leccionação dos futuros jornalistas. Não há jornalismo participativo em Portugal, diz Granado, porque a mentalidade é retrógada e existe o medo do digital.

 Por último, Granado sugere que, no futuro, o jornalista tem de se preocupar mais com os leitores e não tanto com as fontes, até porque o leitor do futuro “sabe mais do que eu”, como escreveu Dan Gillmor.

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domingo, 8 de setembro de 2019

TEMPOS CONTURBADOS


    Temos estado sujeitos a um logro magistral, no seio do qual vamos todos vivendo (?!), há já demasiado tempo, num mundo comandado pela ambição demolidora do bicho-homem, cuja cobiça e soberba, corrosivas, tendem a perpetuar políticas artificiais, em nome de objectivos que devastam e aniquilam, em todo o mundo, milhões de vidas, na sua caminhada inexorável, em favor de lucros sempre crescentes, que passam pela destruição sistemática de outros tantos postos de trabalho.

    Tudo se passa exactamente como descrevemos no parágrafo anterior; no entanto, tudo se anuncia como se aquilo que efectivamente se verifica, fosse apenas cíclico, e pudesse ser contrariado ou invertido, através de políticas reformistas, configuradas por estratégias vigorosas, tendentes a perpetuar a ilusão fantasmagórica do tótem dos nossos dias: a visão fugaz e holográmica do trabalho remunerado.

  Contudo, o homem continua a aspirar, acima de tudo, à liberdade, e a experiência – as várias experiências – colectivista(s), onde as elites dirigentes protagonizam, a seu bel-prazer, ambição, expansionismo e belicismo, redundaria num total fracasso, frustrando o povo, oprimido pelos déspotas.

  O conceito de trabalho, tal como hoje o concebemos, foi há muito ultrapassado, pelo que a ideia de emprego a ele associado, não passa de uma alucinação quixotesca. Não adianta tentar agarrar, desesperadamente, as sombras de um mundo que não chega sequer a ser alegoria, uma vez que o vazio está aí, porque a realidade a que alude, pura e simplesmente não existe.

   A crise internacional, a crise europeia, a crise portuguesa são episódios de uma novela mal contada, com que nos entretêm, levando-nos ao equívoco, à alienação. Estamos todos perante uma alteração brutal, isso sim, do figurino civilizacional à escala global; estamos todos já perante uma nova era, sem termos percebido que a anterior desapareceu. Se não agirmos em função da nova realidade e continuarmos agarrados a fantasmas virtuais, não conseguiremos nunca encetar um novo caminho.

   E, perante a realidade sensível que políticos insensíveis deturpam, Portugal tombou já no abismo do descalabro, numa demonstração de insuportável incapacidade, de escandalosa impreparação, de despudorada falta de sentido patriótico.

    Por último, importa aludir ao curioso e recorrente joguinho das sondagens. Como escreveu Feuerbach (1804-1872), no prefácio à segunda edição de “A Essência do Cristianismo”: “(...) o nosso tempo prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser (...)”.

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quinta-feira, 5 de setembro de 2019

ERRAR É HUMANO


   Acabámos de escutar, numa breve entrevista televisiva, um especialista em saúde, quiçá doutorado, afirmar, “(...) oxalá póssamos esperar (...)”. Pois! por esta não esperávamos nós! Dever-se-á tal erro, por hipótese, a um qualquer resíduo de ignorância larvar, arreigadamente provinciano, ou, como diz Freud, a uma “acção errónea” – o que vai dar ao mesmo –, enquanto falha oral, neste caso, devido à acção do inconsciente sobre o consciente?! Já respondemos!...

    Neste caso, sim, já que as falhas também ocorrem, pelo mesmo motivo, na altura da colocação dos objectos, da escrita, da leitura e da memória; o conceito de acção errónea inclui também as acções sintomáticas e as fortuitas, e, sendo embora involuntárias as primeiras e inesperadas as segundas, ambas se ligam numa dependência recíproca aos impulsos inconscientes e a mecanismos de defesa e compensação.

    Segundo um aturado estudo de Freud (1904), publicado sob o título Psicopatologia da Vida Quotidiana, estes fenómenos (acções erróneas) ocorrem no dia-a-dia e ligam-se à sintomatologia dos doentes neuróticos, podendo ser constatados através da Interpretação da linguagem dos Sonhos. Assim, o sujeito é barrado pelo seu próprio mecanismo de defesa, quedando-se pela falha de expressão; a correcção exterior deve induzir a normal autocorrecção sem perturbações nem dramas; por norma, fingimos ser mera distracção ou obra do acaso.


   E Freud continua: a origem dos erros e falhas verificados no quotidiano é a mesma de tudo quanto de absurdo e abstruso ocorre nos sonhos, embora nestes tudo seja menos claro e inteligível; enquanto acordados, podemos e devemos ser testemunhas das nossas próprias falhas e incorrecções, para que as possamos emendar. Em conclusão, Freud afirma que a fronteira entre normalidade e anormalidade é ténue e variável e que neuróticos somos todos.

NOTA 1: Melanie Klein (1882–1960) afirmaria depois que a oscilação dinâmica entre as posições esquizo-paranóide e depressiva e vice-versa é saudável e necessária.
Nota 2: Imagem do Google




quarta-feira, 4 de setembro de 2019

O TURISMO MEDICAMENTOSO

     Face ao conceito de saúde, definido pela O.M.S - “um estado completo de bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”, mais fácil se torna seguir na linha de desenvolvimento da interpretação que outros autores fizeram sobre esta matéria. C. Michael Hall diz-nos que o Turismo de saúde não constitui nada de novo, na medida em que existem registos de inúmeras viagens e deslocações, por parte das pessoas, dirigidos tanto a estâncias termais como a zonas do litoral. No entanto, todas estas movimentações, segundo o autor, configuram algumas mudanças, quer qualitativas quer quantitativas.

     Ainda conforme o autor, este tipo de Turismo foi definido pela International Union Tourism Organizations (IUTO), agente de ligação da United Nations World Tourism Organization, como sendo “the provision of health facilities utilizing the natural resources of the country, in particular mineral water and climate” (IUTO, 1973: 7).

     Hall, citando Goeldner 1989: 7, define, por sua vez, Turismo de Sáude como sendo: “1 – staying away from home, 2 – health (as the) most important motive, and 3 – done in a leisure setting”. Este autor, mais uma vez, apoiando-se na síntese de duas consultas a partir de Goodrich and Goodrich 1987: 217 e Goodrich, ano 1993 e 1994, apresenta-nos a definição de Turismo de saúde, em termos de conceito estritamente ligado ao Turismo de cuidados de saúde, como sendo: “(...) the attempt on the part of a tourist facility (e.g. Hotel) or destination (e.g Baden, Switzerland) to attract tourists by deliberately promoting its health care services and facilities, in addition to its regular tourist amenities”.

     Para complementar o que foi dito, Hall, citando, Goeldner (1989), reconhece cinco componentes do mercado de Turismo de Saúde, cada um destes identificador de um mercado específico e que também tem categorias em relação a este tipo de Turismo: “Sun and fun activities (leisure tourism); Engaging in healthy activities, but health is not the central motive (outdoor recreation, adventure tourism, sports tourism, and wellness tourism); Principle motive for travel is health (e.g a sea cruise or travel to a different climate) - (health Tourism and wellness tourism); Travel for sauna, massage, and other health activities (spa tourism and wellness tourism); Medical treatment (medical tourism and dental tourism)”.

     Não obstante as cinco razões apontadas no sentido de identificação dos sinais que determinam a procura do Turismo de Saúde e Spa, isso ignora tanto a importância do papel desses mesmos produtos nas promoções e marketing, como na componente do desenvolvimento de estratégias do turismo. Hall, na busca de garantir uma definição, coerente com as definições oficiais de Turismo, sugere que Turismo de saúde seja definido como: “(...) a commercial phenomena of industrial society which involves a person travelling overnight away from the normal home environment for the express benefit of maintaining or improving health, and the supply and promotion facilities and destinations which seek to provide such benefits” Hall, 2003: 274.
Nota 1: Article citation: C. Michael Hall, (2011) "Health and medical tourism: a kill or cure for global public health?", Tourism Review, Vol. 66 Iss: 1/2, pp.4 - 15
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domingo, 1 de setembro de 2019

SE SE RENDEM


                                                                                    
                         Se se rendem à quebra do limite
                 se se cortam no gume da navalha
                 como quem do desejo se demite
                 sem saber de que lado da medalha

                 é melhor agarrar pois quem gravite
                 na vogal virtual que sempre falha
                 - valorizam impulsos sem rebite
                 de posse desvairada que coalha 

                 Remendar identidades difusas
                 sem base nem suporte da razão
                 só por graça das vis hipotenusas

                 no fecho dos triângulos que são
                 conceitos de sensações inconclusas
                 mal-esboços de débil sujeição

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