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Em uma das nossas publicações poéticas (Lágrimas – 1997),
a autora do prefácio, a dado passo, cita Émile Durkheim (1858-1917) para
fundamentar a ideia de que ninguém consegue viver sem amor... “o homem que
vive isolado ou é Deus ou é uma besta, mas não é nunca um ser humano”. E
nós acrescentamos: tal criatura encontra-se já enredada nas teias da loucura,
pois não é possível viver sem amor. No
entanto, tenhamos sempre presente que, quer o amor quer o ódio são faces
contíguas da mesma moeda relacional – afectos de atracção e afectos de aversão,
como teorizou Alfred Adler (1870-1937).
Curiosamente, se conceptualizarmos, aqui e agora,
dicotomicamente, a representação mental sobre a qual discernimos no presente
escrito (o amor e o ódio), dado que algo existe apenas em função do seu
contrário, somos levados a recordar Empédocles (+ ou – 492-432 a. C.) por ter sido este filósofo
o primeiro a considerar, em sentido cósmico-metafísico, o amor (Philia)
como princípio de união dos elementos constituintes do universo, e o ódio (Neikos)
como fautor de separação.
Platão (428-348 a. C.) viria depois a dedicar uma
renovada atenção à problemática do amor, revestindo-a de uma nova centralidade.
Este filósofo chegou a comparar o amor a uma forma de caça; ou então, a uma
espécie de loucura; no escrito Fedro, o amor é visto como um deus
poderoso. Depois, este pensador da Grécia antiga, divide-o no amor do corpo, no
da alma e no de ambos; podendo ainda ser mau e ilegítimo ou bom e legítimo – o
do primeiro tipo seria aquele que não está iluminado pela alma e que despreza a
irradiação das ideias, logo, o corpo deve amar, sim, mas por amor da alma, para
se enquadrar no do segundo tipo.
Quem não ouviu falar já do amor platónico?!... Este amor
queda-se pela sua própria essência, permanecendo arquétipo de si mesmo na
sensualidade acessória dos corpos transfigurados pelos resplendores ofuscantes
da luz da alma; e é esta luminosidade invisível que apaixona os amantes e gera
a beleza magnética da atracção mútua, do recompletamento e fusão meteórica dos
corpos e das almas. Mas a posse é periclitante, efémera, pendular, metafísica,
enquanto reflexo transitório, participado, do amor à beleza absoluta, “que é
ideia do Belo em si”, como refere Platão, no Banquete.
Com o dealbar do cristianismo, o conceito de amor expande-se a
novas representações, mais ou menos divinizadas, conforme os seus arautos,
através de uma óptica, por vezes, redutora, como aconteceu com São Clemente,
para quem amor deveria ser todo o ser e perfeição. Ainda hoje esta doutrina faz
escola através de um eclectismo teosófico que parte da gnose esotérica estribada
na transmissão pacífica do conhecimento tradicional pan-religioso.
Um outro Doutor da Igreja, Santo Agostinho,
estende o amor à caridade, conseguindo ainda ver o amor não só como mal se se
aliar a este, mas também como bem se se ligar ao bem, sendo que, o amor a Deus
é sempre um bem, mas, torna-se um mal se se “basear numa inclinação puramente
humana”... Santo Agostinho dixit! Nos dias conturbados de hoje,
de constantes e graves conflitos, o amor deve ser compreensão, empatia e
altruísmo filantrópico, num quadro de ponderada, sensata e equilibrada
autotranscendência relacional.