IMAGEM INCONCEBÍVEL
A discussão do programa do actual governo de Portugal (Novembro
de 2019) aponta para a necessidade de lutar pela redução drástica do número
de reprovações ao longo dos nove anos da escolaridade básica. Primeiro, foi
desbaratada a classe docente; depois, foi destruído o sistema educativo; agora,
surgem as apreensões com o redutor e inquietante quadro de insucesso dos alunos
portugueses. Este telhado não assentará nunca sobre uma estrutura que já
colapsou, devido à incúria dos sucessivos governos.
A escola não é
mais do que o reflexo da sociedade. Se, por um lado, no ensino pré-escolar a
criança não brinca nem joga o suficiente e é já obrigada ou levada a aprender
alguns rudimentos de aritmética e leitura (?!!!), por outro lado, é impedida,
por falta de instalações adequadas, de dormir as necessárias e indispensáveis
sestas. Quer num caso quer no outro, fica comprometido o papel da integração
pessoal e social no jardim-de-infância, sendo coarctados a essencial paz de
espírito, a observação, a acção, o conhecimento e a figuração.
Desleixado este
alicerce estruturante, na fase seguinte (1.º Ciclo do Ensino Básico) como
estará a maturidade psíquica, social e afectiva da criança?! Estará apta a
expandir-se, exigindo novos princípios ordenadores, actividades e contactos ou
encontrar-se-á fixada em estádios arcaicos de desenvolvimento? Estará apta a
abandonar o seu egocentrismo generalizado e caprichoso, para aceitar a privação
e a observação da consciência da regra? Poderá transitar do sinctretismo para a
diferenciação? Do jogo em isolamento colectivo para o sentido de tarefa, de
criatividade... para as representações mágicas-pré-lógicas, para o raciocínio
operatório (Piaget)? Para o domínio dos instintos?
Como o ambiente
familiar deixa muito a desejar – em Portugal, um quarto (25%) da
população enferma de carências gritantes –, quando a criança chega ao 2.º
Ciclo, tudo piora ainda mais. Trata-se da difícil fase de transição da
infância para a adolescência em progressão: alterações hormonais, somáticas,
temperamentais, desarmonia motriz; clivagem desenvolvimental geral entre
géneros, evoluindo as raparigas cerca de dois anos relativamente a uma certa
estagnação infantilizante dos rapazes... e a complexidade psicopedagógica,
didáctica e lectiva (sempre ignorada) que tal desfasamento implica?!...
Aqui, a
identidade, a afirmação, a inserção e a pertença, a interacção, a abertura e a
aceitação dos pares e das hierarquias; a génese das psicoses e das perturbações
patológicas da personalidade, em maior ou menor grau: a esquizo e a ciclotimia,
a histriónica, a narcisista, a exibicionista, a paranóide em maior ou menor
grau, etc., etc., etc.; as deformações de carácter, a tentação do bullying,
o sucesso ou o insucesso, o autismo digital, a segregação relacional; as turmas
sobrelotadas, a anarquia e a impunidade, a compulsão repetitiva, a alienação
virtual e o vazio mental são realidades que não podem nem devem ser
descartadas. Claro, mas o sistema educativo nacional não tem querido saber
estar à altura. Fechemos todos os olhos
e seja o que Deus quiser.
NOTA: Deixo,
aqui, este breve esboço sobre uma temática que, por si só, justificaria um
extenso ensaio.