sábado, 30 de dezembro de 2017

A SOLIDÃO E O VAZIO AFECTIVOS



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    No passado dia 25 de Dezembro, isto é, no dia de Natal, a escassos minutos da hora de jantar, junto ao aconchego da família e de alguns amigos, gozávamos o calor da lareira onde crepitavam algumas achas de azinho. Entretanto, no remanso descontraído da conversa, escutámos de um dos presentes (adulto) uma curiosa confidência: "Nunca fui capaz de concretizar os meus projectos de vida, porque não consigo deixar as pessoas de quem gosto."...

   Escusado será dizer que conhecemos muitas pessoas que enfermam deste mesmo mal e que, no dia-a-dia, não fazem mais do que se tentar enganar. É que, na prática, esta gente não gosta de ninguém nem muito menos de si própria. Trata-se da vulgar síndroma da imaturidade que consegue vencer décadas e, na maioria dos casos, acompanha estas pobres almas desamparadas até à cova.

       Já aqui escrevemos sobre o amadurecimento do indivíduo, que não acompanha necessariamente o devir cronológico (este é inexorável), nem a evolução mental, fisiológica ou afectiva. Qualquer criatura para crescer harmonicamente não pode ser absorvida pelos pais devido aos seus pavores inconscientes, às suas angústias debilitantes e deprimentes, o mesmo vale por dizer, ao seu infantilismo redutor e castrante. É este exactamente o caso da pessoa que nos fez a atrás aludida confidência.

       Atrevemo-nos a dizer, depois de termos opinado, há tempos, sobre as famílias numerosas, que há famílias que não merecem os filhos que tiveram. Reparem: o grau de harmonia do casal, que muito legitimamente pretende deixar descendência, é fulcral no quadro dos afectos de atracção (Adler). É, essencialmente neste âmbito que se vai gerando o clima familiar, sempre alicerçado pela interacção inconsciente do pai e da mãe e de todo o tipo de experiências que vão protagonizando entre si, quer ao nível sexual, como familiar, social ou de outro tipo.

   Uma individuação bem definida; uma identidade harmoniosamente estruturada; uma autonomia perfeitamente construída, no sentido da emancipação segura e responsável; um self consciente e orientador podem, afinal, constituir mais-valias gratificantes que garantam às crianças nascidas de pais adultos, dotados desse tipo de caracterologia, uma educação em liberdade, evitando que as sensibilidades mórbidas dos adultos mal formados possam intoxicar a vulnerabilidade infantil.

       





quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

HEMISFÉRIOS CEREBRAIS E DOMINÂNCIAS



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     Nos cérebros dos homens e das mulheres existem diferenças biológicas relativas que, naturalmente, determinam reacções, atitudes e comportamentos individuais e relacionais (familiares, conjugais e sociais) diversos. As mulheres mostram-se mais envolventes, abrangentes e extensivas nas suas preocupações; estas são características de que a Natureza as dotou para protecção e defesa das “crias”, durante as idades mais tenras. Atente-se, já agora, e a talho de foice, no ângulo de abertura das articulações que ligam os ante-braços e braços das mulheres (superior a 180º), para mais facilmente abarcarem os filhos pequenos. Esta é uma realidade antropologicamente reconhecida.

     Já os homens são mais analíticos, intensivos, calculistas, focados e menos propensos à rotina; isto, segundo os neurologistas que aliam este tipo de aspectos à dominância do hemisfério cerebral esquerdo. Nas mulheres, portanto, é o hemisfério cerebral direito a ditar as regras. Sendo assim, elas, pelo contrário, são mais conciliadoras e receptivas, mais pacientes e sociais (socializadoras), mais criativas e românticas... Sim, ainda hoje, e ainda bem!

     Ainda que o hemisfério esquerdo responda pela estrutura linguística, pela lógica, pelo cálculo matemático e pela gestão do tempo (tal como o entendemos), orquestrado este a partir dos movimentos de rotação e translacção do planeta Terra, enfim... “Todo o tempo é eternidade”, afirmou T. S. Eliot (1888-1965) -- Prémio Nobel da Literatura em 1948; mesmo que o hemisfério direito influencie a capacidade de síntese, a avaliação empírica, a aptidão para sonhar, na prática, porém, é esta diversidade que concorre para o colorido refrescante e complementar das relações entre homens e mulheres...

      ... Não perdendo de vista, nunca, que, em cada um de nós, mulheres ou homens, homens ou mulheres, estão presentes, necessariamente, ambos os hemisférios cerebrais, sendo a dominância exacta de cada um deles impossível de medir, mas passível de unir.


            NOTA: A todos os leitores do presente blogue – ANGULUS RIDET – http://maranduvaline.blogspot.com, faço chegar os meus votos sinceros de um Santo e genuíno Natal, com muita paz e amor.

AMAR É LIBERTAR



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       Vivemos, hoje, na Europa, em países – uns mais, outros menos – elaboradamente democráticos; preocupadamente sociais; economicamente racionais e contidos... Enfim, arduamente civilizados. Mas, como tudo isto contrasta com o resto do mundo, temos sido, de forma progressiva – ou melhor: galopante –, nos mais recentes anos, objecto do desejo – não sei se obnubilado, se indefinido; se desesperado, se de sobrevivência, dos povos e das gentes que, em outras paragens próximas/distantes se vão agarrando a um certo imaginário simbólico inconsciente, representado pelo nosso continente, face à rudeza brutal e sanguinária de facções que nas suas terras os perseguem, torturam, escravizam e matam. Assim vai o mundo!

     Trata-se, portanto, não da cultura da liberdade e do amor; da tolerância e da fraternidade; da solidariedade e do altruísmo; mas antes, isso sim: do ódio activamente persecutório; do sadismo mais abjecto; da intolerância mais sinistramente destruidora. Será que é este o preço que temos de pagar por, ao contrário dos restantes animais, sermos capazes de contrariar os instintos e optar pela racionalidade que a linguagem viria a potenciar ainda mais?! Estranho paradoxo, este, não acham?...... Ou talvez não! Freud (1856-1939), quando discerne sobre a Metapsicologia, refere que o ódio, o sadismo e a agressividade estão na génese do instinto de conservação e afirmação do ser humano.

       Viktor Frankl (1905-1997) é um conhecido psicanalista que, por ser judeu (austríaco), sofreu na carne, em 1942/43, com a demais família, a violência nazi, em Theresienstadt e, em 1944, em Auschwitz, tendo sobrevivido ao Holocausto, apenas ele e a irmã Stella. Retirou daí ilações, e desenvolveu a teoria do impulso vital do indivíduo para a criação de um sentido para prosseguir a vida, mesmo face à mais negra adversidade. Curiosamente, experimentámos este mesmo sentimento emocional, nos idos de 1972 e 1973, na mata cerrada dos recônditos Dembos (Angola), em contexto de guerrilha.

        Concordamos com Viktor Frankl neste particular, mas não acompanhamos o seu raciocínio quando este cientista afirma que nos nossos dias a sociedade já não é sexualmente frustrada (afecção disruptiva de afectos), ao invés do que defendeu Freud (1856-1930); ou que, conforme sustentava Adler (1870-1937), já não existe o sentimento de inferioridade, por parte das pessoas... Que bom que seria, se assim fosse! A que se deve, então, o tráfico humano e a escravatura sexual nos dias que correm? E as constantes violações? E a violência doméstica? E a alienação parental? E o “bullying” nas escolas e nas empresas? Em todas estas e outras situações, em qualquer continente ou sociedade, e, quer por força da frustração sexual, quer ainda devido ao sentimento de inferioridade (disfunção identitária que pode promover o abuso de poder, por exemplo), quer tendo em conta o vazio existencial e a falta de sentido na vida – são tudo realidades sistémicas e parasitárias –, existem milhões de pessoas que sofrem diariamente. A neurose atrai a neurose. A psicose pode matar ou suicidar. É que só o amor é libertador, como pregou São Paulo aos Coríntios.

        Todavia, devido à tensão brutal a que estão sujeitas as pessoas, tendo em conta a organização da sociedade, nomeadamente no que respeita à indução familiar e educativa e aos posteriores condicionamentos dos adolescentes e jovens (Robert Ollendorff), leia-se repressão (sexual), frustração e neurose – estas radicam no borbulhar larval do desejo recalcado –, continua a fazer sentido a tese de Freud e de Adler (e a de Frankl, também), uma vez que a estrutura social, política, económica e empresarial se assemelha a um tenebroso espartilho, redutor e castrante da energia dos impulsos.

     Freud refere esta força, esta tonacidade anímica genérica, como a “catexe” que ocupa o conteúdo psíquico, cujo aumento do desejo desencadeia a repressão e a proximidade do inconsciente; quando esta energia se torna mais forte ainda e incide sobre certas pessoas ou objectos – “catexe do objecto”, pode determinar identificação (ambivalente, embora) com aqueles. É curioso notar que Adler tenha optado por designar o mesmíssimo fenómeno por fixação, e Jung (1875-1961) lhe tenha dado o nome de obsessão. Na prática, trata-se de mecanismos esquizóides (Melanie Klein [1882-1960]), cuja exacerbação redunda em anomalias psíquicas, estados obsessivos, caprichos e ideias fixas que degeneram em psicoses. Infere-se daqui que a força primária do desejo ignora o tempo e a realidade exterior, porque quanto mais potenciada é, mais facilmente é captada pelo inconsciente.

            

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

RIA DE AVEIRO RIA





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Ria de Aveiro Ria
meu poema vivo movente
ou discreta melodia comovente


Ria de Aveiro Ria
derreada Ria
ou oscilante desejo
jubilado anseio ou jazida
refulgente sonho argentino
plúmbeo lençol agreste
metamorfose ou miragem
abandonada às marés

Minha Ria meu celeiro
cintilações de memória
sementeira ecologia
meu sentido emocional
só no âmago do teu seio
mora o tempo uno inteiro
por sentir de novo o sol

Minha Ria meu poema
sê apenas como és
puro anseio absoluto
nos meandros da lembrança
meu arrepio fremente
traço ardente especular
metamorfose ou miragem
lodaçal lirismo lúdico
abandonado às marés

A LIBERDADE É UMA ABSTRACÇÃO



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         Não há volta a dar-lhe. A liberdade é uma abstracção. Tanto mais, quanto mais dela se fala. Já repararam na dificuldade, quando não na absoluta impossibilidade de nos referirmos à “Liberdade” enquanto realidade sensível?! Sim, o que é, afinal, a liberdade enquanto realidade sensível?! Tal representação palpável não existe, de facto. Pode existir, contudo, no domínio dos conceitos, das ideias; muito embora, neste caso, se verifique uma clivagem mental de certos elementos constituintes de determinada entidade complexa, não abarcando, portanto, na totalidade, a sua base material.

            Não é por isso, contudo, que a liberdade pode correr o risco de ser escamoteada dos desejos, das preocupações, dos sonhos mais prementes do ser humano. Tal desiderato colaca-se hoje, mais do que nunca, devido à escalada da violência interétnica, da ameaça global da alta finança, do espectro dos novos imperialismos, da renovada corrida aos armamentos de destruição massiva. Tudo isto traz à memória colectiva, as duas últimas guerras globais e as respectivas causas económicas, políticas e sociais que as precipitaram. Vivia-se, nesses tempos, sob a égide da rigidez educacional, da intolerância religiosa, da sofreguidão económica, do abuso de poder, da estratificação social.

         Importaria, agora, que a Educação seguisse novos rumos, privilegiasse renovadas e criativas opções, enveredasse pelos refrescantes caminhos da decência pedagógica, da liberdade relacional ancorada em aprendizagens significativas, no âmbito de um enquadramento sustentado no pleno conhecimento das várias etapas da psicologia do desenvolvimento. Nada disto se passa. A (des)educação continua a alicerçar personalidades ignorantes, patéticas, indesejáveis, doentias, potencialmente sado-masoquistas. A sociedade continua a enfermar de várias epidemias psíquicas – basta estar atento à comunicação social.


       A falta de liberdade, de coerência, de equilíbrio psicopedagógico, de sentido prático e de efectiva e funcional harmonia didáctica, configurada pelo ancilosamento das estruturas de ensino/aprendizagem (agrupamentos, inconsistência curricular, deriva psicopedagógica) não favorecem: nem o conhecimento, nem o crescimento mental, nem a maturidade do carácter das crianças, dos adolescentes e dos jovens. Ai de quem ignora a fase mágica do desenvolvimento infantil. É que vai sendo tudo cada vez menos diferenciado, poético e simbólico, porque se combate, tacitamente (ou não), os sentimentos mais profundos das crianças, as sensações mais legítimas dos adolescentes e os pensamentos mais criativos dos jovens. E não é que os alunos são um extraordinário radar?! Eles vão crescer absorvendo instintivamente tudo o que de pior lhes oferece a educação e os adultos a ela ligados (consciente e inconscientemente), crescendo na perversidade, mas regredindo dissociativamente para o infantilismo, sem apelo nem agravo. Nem por isso se sentirão mais livres e felizes no seu dia-a-dia. Antes pelo contrário!

SUBSÍDIOS PARA DEBATER A ADOLESCÊNCIA



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        O inesgotável interesse pelo debate (democrático) de ideias permanece, por isso mesmo, infinito, profícuo e gratificante. Esta prática, enquanto actividade intelectual profundamente saudável, deve ser capaz de se furtar aos actuais ventos que vão soprando das omnipotentes, omnipresentes e omniscientes redes virtuais, ditas sociais, para que a erecta postura filosófica de quem raciocina não seja devastada (já aqui o escrevemos), pela dependência viciante, ilógica e ambígua, vazia de verdade e emocionalidade, dessas mesmas redes.

        Aqui, ganha a globalização à territorialidade; a uniformização dos contextos vence o polimorfismo das envolvências; o ecletismo ponderado e selectivo perde perante o seguidismo mimético dos cultos, das crenças, das assunções e dos ritos formatados... Desembocamos todos, afinal, na fossa da solidão virtual; no isolamento; no pensamento único padronizado; na vacuidade do tempo e do lugar, “trabalhando”, sem pensar, no sentido de garantir uma cada vez mais castigadora angústia existencial.

        “Nem tanto ao mar, nem tanto à terra”, diz a sabedoria popular, isto é, “in medio virtus”. Sendo assim, importa saber gerir as “TIC” com inteligência, tirando partido das suas reais potencialidades, não dando nunca por concluído o debate em relação às mesmas, e, acima de tudo – e aqui a incumbência aplica-se rigorosamente à família primeiro, e à Escola depois –, não isentado de responsabilidades todos quantos tutelam crianças e jovens em formação.


          Por falar em jovens... Joaquim Leitão, cineasta português de grande talento, depois de concluída a sua mais recente obra cinematográfica (2017) – “O Fim da Inocência”, suponho, estará a aguardar as reacções dos críticos. Tratando o filme, da maneira como os adolescentes se devotam à contingência, ao social, aos objectos externos, deixando-se envolver de forma precipitada, fatalista e parasitária, na vida nocturna, nas drogas, no sexo, no álcool, na vida relacional meteórica, inconsequente e irresponsável, para depois passarem o dia na cama – em contraciclo biológico, aventaremos uma primeira observação: Não estará J. Leitão a meter no mesmo saco, por inteiro, todos os adolescentes e jovens portugueses?! Ou terá o cineasta optado apenas pela franja dos que não resistem à atracção do abismo?!