quinta-feira, 5 de julho de 2018

SONETO ANTIDEPRESSIVO






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                  Nessas tão duras pedras do caminho
                  moram forças ocultas de razão
                  a ditar sem saberes o desalinho
                  da vida temperada de ilusão

                  É melhor que não penses no mesquinho
                  do futuro com tiques de ladrão
                  e não sintas a dor do tal espinho
                  que te tolhe na praça da sezão

                  Segue pois por veredas e vielas
                  por colinas erguidas em altura
                  não cedas nos desertos mais musgados

                  Reforça a dinâmica das bielas
                  e no brilho da luz que sempre dura
                  vai fundo como fazem os arados



IDEIAS E IDEAIS



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            Tolstoy (1828-1910), Neill (1883-1973) e Dewey (1859-1952) – dizia-nos um interlocutor de circunstância que já não têm voto na matéria, por terem morrido há um número considerável de anos (?!!!) – defenderam ao longo das suas vidas um conjunto de ideias revolucionárias para a época, na óptica da implementação de ideais nobres, mormente no que à escola dizia respeito: ao invés de a mesma ser vista como um complemento circunstancial de lugar onde se depositam crianças, aquela deveria passar a ser olhada como um enquadramento formativo, de âmbito relacional. Aqui, a intersubjectividade das pessoas em presença (docentes, discentes e pessoal coadjuvante) ganharia consistência na consideração da importância, fundamentalmente, da vida escolar do quotidiano, isto é, não tanto com os olhos postos no futuro nem com a obsessão de educar no sentido restrito do acto.

            Neste aspecto particular, John Dewey mostrava-se intransigente e assertivo, tendo afirmado mesmo que os profissionais do ensino, enquanto móbil institucionalizado do poder, não possuíam nenhum tipo de competência didáctico-pedagógica, já que exerciam sem amor. É que a educação não pode nem deve ser confundida com práticas de condicionamento e doutrinamento das crianças, como vem acontecendo, também nos nossos dias, cada vez com mais eficácia e sistematicidade, visando a subreptícia exploração social e ideológica dos indivíduos que constituem, desde já, a matéria-prima (argamassa) do tecido sócio-comunitário.

            Nas décadas que se seguiram ao fim do segundo grande conflito mundial (1939-1945), muito boa gente tentou concretizar projectos educativos, repletos de inteligência, criatividade e sentido prático, embora raros tenham resistido ao cinismo ideológico das políticas que sempre cedem aos intentos dos mercados. Leila Berg (1971) – (1917-2012), na obra Children`s Rights, na qual colaborou, refere algo profundamente polémico, relatado pelo jornal Washington Post de 29 de Junho de 1970: às crianças (três a seis mil alunos) mais desfavorecidas e irrequietas da cidade de Omaha, para não incorrerem em problemas de indisciplina escolar, eram-lhes prescritos (escândalo dos escândalos) Ritalina, Dexedrina, Deaner, Aventyl e Trofanil (Berg, 1971: 66).

            Neste quase final de quartel do século XXI, este tipo de métodos, este género de estratégias aberrantes ter-se-ão alterado, quiçá modificado, reconvertido – julgamos nós –, até porque os objectivos que procuram alcançar, encontram um aliado de peso... exactamente, referimo-nos às novas tecnologias de informação e comunicação, sempre em tempo real e globalizadas. Estas vão pautando, não só o pensamento único, politicamente correcto, mas também a uniformização comportamental dos seus mansos seguidores, viciando, impedindo-os, imaginem, delas se desligarem, até mesmo, como temos testemunhado, à mesa de um qualquer restaurante. E eles aí estão: sentados à mesa com os pais e a sua complacência mórbida, apenas fisicamente, mas ausentes de contexto, auscultadores nos ouvidos, sempre sobre o carapuço ou boné (?!), ou sobre ambos (?!!!), um olho no tablet e o outro no bitoque. É trágico, sem deixar de ser caricato.

           

O FUNDAMENTO DA VIDA




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    Neste nosso mundinho tão divergente e contraditório, estamos todos condenados a suportar uma existência repleta de condicionalismos e alienações, caso enveredemos pelas mansas atitudes do seguidismo mimético, que vai tolhendo os últimos resquícios de autenticidade criativa do ser humano, numa espécie de atavismo redutor de acomodatícia restrição anestésica, impeditiva do mais legítimo direito de usufruto da saudável dinâmica de intersubjectidade relacional dos indivíduos, na rota da felicidade.

            Tendo em conta os factos do quotidiano, mil vezes repetidos e revistos, virtualmente, em tempo real, por cada vez mais criaturas globalizadas, urge adoptar uma postura filosófica face ao peso demolidor dos acontecimentos, e, mais ainda, em relação aos objectivos dilacerantes de um conjunto de contextos cujos conteúdos são ardilosamente orquestrados, no sentido de todos enfiar numa linha de actuação (auto)matizada pelas motivações mais primárias, logo, instintivas e animalescas, isto é, sem nenhum tipo de racionalização ponderada.

            Será que alguém se deteve já, para pensar, até que ponto não andaremos todos com a cabeça à razão de juros, ao invés de sondarmos as pricipais razões de fundo que possam, eventualmente, justificar... bem, se calhar ficar-nos-emos apenas pelo âmbito das explicações, tendentes a clarificar o nosso papel na família, na sociedade e a nível planetário. O planeta (do grego, planétes = errante) Terra é a nossa casa comum e deriva, errante, em torno do sol, qual montanha russa em delírio de vertigem sob a luz multicolor dos holofotes da feira existencial das angústias. Pois, mas a vida tem outras vertentes e é necessário que nos saibamos situar.

            Em primeiro lugar, vamos tentar perceber em que se fundamenta o sistema conceptual que é regido pelos códigos humanos de conduta (princípios, valores, códigos, normas, leis, crenças, cultos, ritos, assunções, etc.). Tem de haver razões, motivos, nexos de causalidade, todos eles plausíveis, bem entendido, que garantam a coexistência pacífica dos homens, a solidariedade, a cooperação e o altruísmo. Dizía-me um jovem adulto (29 anos), há dias: “ imagine que tudo funcionava dessa maneira!... Já se teria verificado o colapso habitacional do planeta e a extinção da humanidade!” Não conseguimos aduzir nenhuma resposta...

            Mas, então, que razão de fundo devemos encontrar para a vida e para o estado de coisas em que (e com que) a mesma se debate?! Fiquemo-nos, então, pela simples razão de fundo do tipo ideal, ainda que a vida seja algo palpável e maravilhoso; a mesma, se não assenta em nenhum princípio, razão ou origem cujo fundamento seja justificável, isto é, que possa ter um fundamento real – a tese do nosso jovem –, no mínimo, agarremo-nos aos fundamentos da racionalidade ideal, enquanto explicação que possa fundamentar a nossa razão de fundo.


            

AS REACÇÕES NEURÓTICAS




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        Enquanto seres humanos, somos todos dotados de um extraordinário e, praticamente, ainda que não absoluto, eficaz mecanismo de defesa que nos permite reagir às experiências emocionais mais agressivas e drásticas do quotidiano, através de comportamentos diferenciados do padrão tido como normal, linear, muito embora essas derivas se consubstanciem em termos muito mais quantitativos do que qualitativos, do ponto de vista caracterológico (etologia) – Stuart Mill (1806-1873) e Wilhelm Wundt (1832-1920).

            Esta óptica inicial de abordagem da problemática das reacções neuróticas, estudada pelos cientistas a que atrás se alude, inscreve-se na revolucionária (para a época) psicologia experimental, marcadamente empírica, que visava imprimir um carácter distintivo à investigação, até aí refém da especulação filosófica. Wundt, principalmente, preocupou-se com a consciência e com as representações sensoriais da mesma. Já John B. Watson (1878-1958) viria a defender a necessidade de pôr de lado o efeito das vivências interiorizadas, argumentando que a distorção provocada pela subjectivação da experiência, redundaria em inevitáveis equívocos. Assim, estes “behavioristas” ficar-se-iam pela simples observação e investigação do comportamento do indivíduo.

            Convém referir, de passagem, a diferença de fundo que existe entre as reacções do tipo neurótico e as que podem ser classificadas como sendo psicóticas: nas primeiras, e ao invés das segundas, o indivíduo regista na consciência a ocorrência vivenciada, não sofrendo de nenhum apagamento de facto ou de sentido (n)a sua relação com a realidade; nesta conformidade, a sua personalidade mantém-se intacta, assim como a sua estrutura concreta de pensamento formal e substancial, e , mais ainda, a manutenção do contacto com a realidade (orientação e lucidez).

            Tipificando, estas reacções neuróticas procuram compensar, combater ou atenuar uma ansiedade de cariz específico, trabalhando o efeito conflitual provocado pelo choque dos objectos internos ou externos, no sentido da preservação dos seus reflexos ansiosos, através da defesa do ego – fobia de deserção, cismas e actos repetitivos, transferência, recalcamento e posicionamento esquizo-paranóide-depressivo – este último, conforme o definiu Melanie Klein (1882-1960). Também Freud (1856-1939) se referiu ao assunto, ao invocar as fixações regressivas primárias (fases oral, anal e fálica), enquanto mecanismos de defesa mental (reacções neuróticas) na formação do sintoma – do grego, coincidência.

            É hoje possível afirmar, sem nenhum tipo de constrangimento ou pudor, de que a percentagem da população nacional a braços com esta sintomatologia (indícios de perturbação ou doença) é muito maior do que seria, à primeira vista, expectável. E tudo começa na infância com certas disfuncionalidades emocionais, como o sonambulismo, a enurese, a gaguez, a aversão fóbica à escola ou certos tiques difíceis de abandonar pela vida fora. Talvez não fosse má ideia, ainda assim, a intervenção de um clínico especializado. É que, embora se trate de mecanismos de defesa úteis, podem não resolver, de todo, o(s) problema(s).