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O termo “hegemonia” tem a sua origem etimológica na palavra grega hegemonía,
e significa precisamente “comando”, isto é, aquilo que se passa exactamente
numa situação de supremacia de uma cidade, povo ou nação sobre outras cidades,
povos ou nações, conforme se pode ler em qualquer bom dicionário da Língua
Portuguesa. O historiador italiano Maquiavel (1469-1527) escreveu em O
Príncipe, que este tipo de hegemonia não é possível, caso as cidades, os
povos ou as nações que vivem em liberdade, uma vez submetidos, não sejam
destruídos. Se tal não ocorrer será o detentor do poder a ser objecto de
destruição (Debord, 2012).
Hoje em dia, a
arma mais poderosa colocada ao serviço da dominação das cidades, dos povos e
das nações continua a ter o nome de hegemonia (“comando”); mas deve ler-se –
consumo –, literalmente. Também aqui, consumir quer dizer, precisamente,
gastar, inutilizar, definhar, dissipar, destruir, numa atitude reiterada de
auto-gestão inconsciente consumptiva; através do espectáculo já não fragoroso e
dilacerante de acções bélicas, mas em obediência à influência das quatro
vertentes integradas do espavento ardiloso do marketing-mix (produto, preço,
promoção e ponto [geográfico]), (Kotler, 2000). Tudo muito mais subtil e
sub-reptício... a determinar o mesmo efeito, desta feita, subliminarmente
cirúrgico e pérfido sem deixar de ser abrangente.
De todos os
animais, o ser humano é o mais implacavelmente territorial e não esconde nem
disfarça essa sua marca idiossincrática; mas também é um ser social, dotado de
extraordinárias competências cognitivas que lhe permitem a relativização de
valores antagónicos e a consideração de perspectivas diferenciadas (Fleming,
1993). Ora, com a omnipresença das novas tecnologias de informação e
comunicação fica diluída a territorialidade em nome da globalização (Marshall
McLuhan, 1911-1980), da mesma forma que vamos sendo invadidos por uma espécie
de uniformização dos contextos, dos cultos, das crenças, dos ritos e das
assunções, a caminho da solidão virtual, da formatação padronizada geradora do
pensamento único, na vacuidade do tempo e do lugar.
As pessoas vivem
agora mais isoladas e perdidas, portanto muito mais vulneráveis aos efeitos das
imagens de dominação das necessidades habilmente forjadas sobre o id * (Georgieff,
1998); e para isto têm concorrido também as decisões urbanísticas. As
cidades fragmentam-se em desoladora clivagem, desertificam-se, e os campos em
redor enfatizam o luto urbano, dando lugar aos delirantes templos do consumo,
dotados de amplos parques de estacionamento e estações de combustíveis (Debord,
2012). Em certas zonas não se sabe já onde começa o campo e acaba a
cidade... e vice-versa, porque se encontram descaracterizados ambos os
conceitos, em nome da economia.
Acontece que a
economia, como qualquer outro sistema regulador da actividade humana, deve ser
colocada sempre ao serviço da comunidade, respeitando a importância da
autenticidade da cidade e a fundamentalidade do campo com carácter redentor,
para que a História se não apague nas malhas de um progresso redutor, falacioso
e enganador, sempre que envolve o Homem na armadilha da inapelável decadência
hodierna.
* id – Este diz respeito ao pólo pulsional donde brotam as
energias anímica e sexual inconscientes, activadoras da dinâmica psíquica,
mais, menos ou nada “controladas” (recalcadas) pelo sujeito e pela sua
consciência moral.
Meu amigo, você anda a fazer excelente leituras, como se percebe pelo seu texto que faz pensar. Realmente estamos numa sociedade tão consumista que assusta. Parece que a economia dos países se reduz a isso. Mas como você diz "a economia, como qualquer outro sistema regulador da actividade humana, deve ser colocada sempre ao serviço da comunidade".
ResponderEliminarGostei de ler. Um abraço.