segunda-feira, 26 de agosto de 2019

O "EROS" NA GRANDE TELA


   Nesta “A Hístória do Sexo no Cinema” o documentário tenta trilhar a senda evolutiva da temática vertente, no quadro da cinematografia deste género, ao longo dos tempos, utilizando o realizador uma éspecie de revisitação do passado, recorrendo a filmes mudos e fotografias de arquivo, sons característicos da época retratada, opiniões de críticos da especialidade, opiniões também de actores e de personalidades diversas, como é o caso notório de Hugh Hefner, o “pai” da Playboy.

   No decorrer das décadas, ‘40, ’50, a abordagem do sexo no cinema continuou sendo tímida, mas eficaz e sempre presente -- veja-se a produção a preto e branco “Lolita”; “Who's Afraid of Virginia Wolf?”, entre outros.

    Já nos anos ’60 e ’70 a temática sexual assumiu contornos perfeitamente viáveis, cuja censura operada pelo famoso lápis azul pouco ou nada cortava, como aconteceu com os filmes “Guide for a married man” e “Midnight Cowboy”. Ainda nos anos ’60, alguns filmes apresentavam cenas de esboço lésbico, absolutamente aceites pelo público, enquanto que a simples presença de um actor cujo desempenho envolvesse, por mais simples que fossem, atitudes e requebros efeminados, constituía motivo para chacota e explosão de gargalhadas.

    Nos anos ’70, já depois do 25 de Abril, o sexo ousa mais – “O último Tango em Paris” insinua práticas sexuais veladas, nunca antes levadas a efeito ou simplesmente sugeridas. Anteriormente, no “Vale das bonecas II” assistimos ao desfile de leves orgias, apenas esboçadas, e à exibição de corpos femininos nus, a todo o ecrã, de visionamento meteórico, sem nunca, no entanto, ostentarem a zona púbica.

    Com tudo isto crescia a preocupação da Igreja que acaba por tomar posição face à invasão sexual das salas de cinema, conseguindo travar a investida do sexo mas não o tendo dizimado. Como quem não quer a coisa, o cinema foi impondo, de novo, as cenas de erotização, começando por abordagens ténues ou cómicas, sexo apenas subentendido ou aspergido, até que se decide classificar os filmes segundo as várias faixas etárias às quais se destinavam.

    Na actualidade têm surgido filmes que tentam impor o sexo travestido de inocente ou de folgazão, em quadros quer idílicos, quer caricatos como o são, respectivamente, os da “Lagoa Azul” e da série “American Pie”.


    Poder-se-ia acrescentar algo mais? Talvez! Mas, para quê? Quando se trata de sexo, pelo menos no cinema, é tudo sempre feito de forma rápida, residual e furtiva. Não quero que esta minha análise fuja do tom do documentário em si, previamente visionado, nem tão pouco da abordagem particular da temática em análise, perspectivada pela cinematografia em geral.

Nota 1: Imagem do Google;
Nota 2: Texto analítico por Inês Santos (2010) 

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

BUCÓLICAS ALUCINAÇÕES


    "(...) as saudades de Arnalda, estavam a deixar Adolfo - que pescava na represa - completamente alucinado.

   De repente, a mulher dos seus sonhos emerge das águas da levada, vestindo apenas, sobre o corpo nu, uma curta combinação encharcada, de linho branco e transparente; o cabelo solto assemelha-se a uma torrente de fios de ouro que tomba em cascata, pelos ombros de Arnalda, até à cintura estreita; o sacerdote pode ver, nitidamente, o umbigo descarado, sob o tecido; as ancas arredondam-se num apelo vigoroso, redundante na visão das coxas fortes, longas e firmes, encimadas ao centro pela loucura triangular do seu crespo musgo púbico, de tom fulvo, onde se acoitam insondáveis mistérios.

   O Padre Fraga luta contra a Natureza, tenta reprimir a vida que gira desvairada, através das suas veias. Não consegue. Todos os esforços são em vão. A imagem de Arnalda permanece na água; agora parece acenar-lhe e... É isso! A mulher está a chorar... Não é só a água que escorre dos cabelos... Agarra com mais força a cana e estarrece...

   Os seios de Arnalda são belos: cheios e firmes, insinuam-se no interior do tecido molhado, provocadores; os mamilos, lúbricos e em riste, apontam na sua direcção, acusadores. O Padre Fraga estremece, a cana cai na água e Adolfo também. (...)"

In "O Chão dos Sentidos" (Santos, 2013: 118 e 119)
https://www.bertrand.pt/livro/o-chao-dos-sentidos-manuel-braganca-dos-santos/15294368
Nota: Imagem do Google

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

O DESEJO E A PALAVRA



   No Ocidente, vivemos em sociedades ditas de direito democrático, onde, por norma, literalmente, qualquer tipo de contrato, em enquadramento circunstancial de lugar onde (de direito e de facto), tem de ser lavrado de acordo com a lei, para que ambas as partes signatárias se possam sentir seguras das garantias das cláusulas acordadas. É assim para as transacções empresariais, para os seguros contratados, para as prestações de serviços (água, luz, gás, telefone, entre outras coisas) e, para os casamentos. Para as uniões de facto, a Lei n° 23/2010, de 30 de Agosto baliza os direitos e deveres dos cônjuges, mas, aqui, creio, não há contratos formais nem assinaturas. Convergem desejo e palavra.

   Contudo, quando se trata de pessoas com sérias perturbações mentais – e como é difícil provar, devido ao facto, a (in)imputabilidade ou (in)capacidade das pessoas em causa –, como é que se faz a prova de que, à data do contrato, se verificava o estado demencial de um dos signatários, por um lado, e, por outro, se a outra parte tirou partido disso mesmo, ou não, tendo havido art-i-manha (“técnica e destreza de mãos”), ou só desconhecimento. Aqui, podem divergir o desejo transtornado e a palavra desvirtuada.

   Quando estamos em presença de psicoses tratadas ambulatoriamente ou em internamento, que diz a lei, afinal? Tente o leitor saber, já que ouvimos falar de pessoas com alta, mas em tratamento severo, que continuam a viver o seu quotidiano, conduzindo automóvel, movimentando-se nas ruas, assinando contratos e, até, improvisando certos comportamentos laborais. Manifestamos apenas a nossa inquietação, uma vez que nada sabemos da sagacidade mental de sujeitos nestas condições, do grau de percepção da realidade, da sua consciência, lucidez e memória. E o médico, que conselhos avançou?!

   Por último, caso a demência, a morte ou o suicídio se verifiquem algum tempo depois de um seguro contraído e, caso não haja uma cláusula que acautele estas três eventualidades, a seguradora terá de cumprir o pré-estabelecido. Acontece que, nestas situações, há sempre quem tente artimanhas, embora questionemos se as mesmas valem a pena, depois de feito o balanço entre as despesas suportadas com o corpo jurídico da companhia e o valor da indemnização a pagar ao segurado. Pois, não sabemos!... Como escreveu o filósofo Philippe Julien, A barbárie instaurada pela incompatibilidade entre o desejo e a palavra põe o sujeito a nu diante dos seus próprios fantasmas”.
Nota: Imagem do Google

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

QUEM SABE SE





 Quem sabe se padecer a compasso
 já não passa de simples concessão
 ou se serve a mais sádica sanção
 cerrada sob o sal do que não traço

 Quem sabe se decidir cada passo
 ao ceder a tal censura ou pressão
 é salsa de sucinta sensação
 ou seda no semi-som do regaço

 Quem cerzir uma tão tensa canseira
 soletra por ser incerto cessar
 mas sobra como massa na masseira

 na sumição de nunca sossegar
 pra selar a sensual dor terceira
 sentença remissiva por sanar

Imagens (2) do Google


sábado, 10 de agosto de 2019

PAIS OU PROGENITORES ?!


Imagem do Google

Também nesta silly-season sou levado a escrever. Só lê quem quer. Podemos estar a falar de tudo e de nada; de alguém ou de ninguém, já que também nos assiste a prerrogativa da loucura diletante ou do exercício da retórica lúdica congruente com o nosso estado de espírito. Mas, por muito que a realidade seja insolúvel [(Lacan) 1901-1981] e Saussure (1857-1913) tenha evoluído – “o signo linguístico une não uma coisa a um nome, mas um conceito a uma imagem acústica” –, o nosso inconsciente (lugar do saber não sabido) continua a ser um incomensurável depósito de lixo tóxico do vivido subjectivado ou não.

Vem isto a propósito da não-elaboração psico-afectiva das crianças, em sede de triangulação familiar (Édipo) e das respectivas consequências asfixiantes. Pois! Quando não se verifica a correcta consideração do terceiro elemento, seja ele o pai ou a mãe, ou um dos filhos, por força do comportamento disruptivo do casal (?!), devido a conflitos intersubjectivos, geram-se moções pulsionais típicas do momento edipiano. Isto problematiza a definição de papéis (pessoais e sociais), estruturantes do sujeito, num enquadramento metapsicológico: identidade, afirmação, individuação, inserção e pertença.

A partir daqui está criado o impasse, a estagnação, a fixação neurótica. Este "chover no molhado" comportamental sintomatiza a própria metáfora parental, e manifesta-se como uma tentativa desesperada do filho(a) inventar uma possível deslocação (desejo) do lugar onde se encontra cativo(a) da economia psíquica dos pais, isto é, da quota parte de importância quantitativa – a qualitativa daria um outro texto – que tem, ou não, para os progenitores.

Estes, imaturos, servem-se do filho, pela incapacidade de debelar a sua obsessão histérica, por esta redundar na (in)consequente frustração das expectativas goradas, pela ausência da própria essência da idealização fantasiada, no âmbito de um delírio obstinado e recorrente. Onde está, afinal, o modelo parental sadio? Não está!, e esta incompetência, esta vacuidade absorvente e asfixiante transforma o sujeito em formação num mero objecto dos desejos ansiosos e sufocantes do adulto (infantilizado, imaturo, ansioso, inseguro, egoísta, infeliz) antes daquele conseguir ser ele próprio. Que surja, ao menos, uma heróica barreira capaz de mitigar males maiores. 

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

INSÓNIA - A PIOR DAS CONDENAÇÕES


Imagem do Google

    Como interrogava um poeta, em 1998, “Com que crédula esperança/se ergue cada sonho/na surpresa da manhã levemente azul?...” e prosseguiu: “A curiosa expectativa da noite extinta/no túnel estreito da insónia/cruza memórias de constelações vivas/com abismos obscuros de incompreensível espanto (...)”. Embora a necessidade de dormir, maior ou menor, varie de pessoa para pessoa, a sua satisfação fisiológica é imprescindível, pelo que é desejável que se verifique um adequado equilíbrio entre sono e vigília.

    A ansiedade e outro tipo de problemas de saúde, quer físicos quer psicológicos, impedem a indução do sono, inibindo a estimulação dos seus factores, através da diminuição do seu fluxo, o que mantem a activação cortical a partir da formação reticular. Por este desequilíbrio podem ser também responsáveis o baixo teor de melatonina, conforme Damásio (2017), bem como as variações na concentração de serotonina nos neurónios dos núcleos do rafe, abaixo da amígdala.

    É impensável não dormir. Só o sono, naturalmente, tem a capacidade de regenerar o cérebro, procedendo à sua síntese proteica. Aumenta o fluxo sanguíneo cerebral. Procede à restauração somática. Estimula, na altura própria, as hormonas de crescimento. Prolonga-se por mais horas nos recém-nascidos e diminui na velhice. É lamentável, portanto, que o Ministério da Educação continue a não responder, no Pré-escolar, pela rigorosa observância da sesta generalizada das crianças, em salas próprias.

    Para combater o flagelo da insónia, há quem tome, mesmo sem aconselhamento médico, todo o tipo de hipnóticos; no entanto, os especialistas recomendam as benzodiazepinas, por serem mais seguras... caso o exercício físico exigente e rotinado no dia-a-dia, não dê resultado. Não veja televisão nem se grude ao computador, antes de se deitar... Isso, leia um livro! É que a insónia é a pior das condenações.

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

SE CORRERMOS


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                Se corrermos atrás da despedida
                ficarão por acaso por sentir
                as lisonjas das buscas que na vida
                contradizem confiscos do provir

                O rio que não sabe da partida
                não sonha com o mar onde fluir
                por seus males ou bens há quem decida
                o tom das águas a definir

                Pensemos e sintamos com ardor
                fazendo convergir os sãos consensos
                e mesmo que nos peçam por favor

                não vamos dar as mãos nem ficar tensos
                por haver quem por mórbido langor
                tente manipular os mais propensos

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

SABER LER NAS ENTRELINHAS


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   Na era da comunicação virtual, global e omnipresente, como fica o jornalismo (televisivo e radiofónico) caso pretenda diferenciar comunicação e informação? Perante a presente dicotomia, não é possível confundir a comunicação intersubjectiva dos indivíduos, ainda que se trate de mero entertenimento, que é relacional, opcional, e informal, com a formalidade que visa a transmissão de determinados conteúdos informativos específicos, servindo receptores mais ou menos vastos. Em ambas, contudo, a subjectividade está sempre presente, bem como o fenómeno comunicacional.

     Sendo assim, importa, principalmente no segundo caso, pugnar por um esforço de aborgagem do real, respeitando a ética profissional e a deontologia jornalística. No primeiro, seria conveniente respeitar a impreparação das massas, não abusando da sua permeabilidade e receptividade à alienação, evitando atropelos à dignidade moral e à integridade mental e física – esta, por arrasto, das audiências.

    A propósito: no ano de 2011, se bem me lembro, uma aluna que apoiei na sua pós-formação universitária, ofereceu-me a obra A Locomotiva dos Sonhos (Paz Barroso, 2008), e, agora, depois da re-leitura da mesma, chamo a atenção para algo que este autor, nascido em 1957, trata, neste livro, de forma muito pertinente: trata-se da “opinião publicada”, que nada tem a ver com a opinião pública.

    Através de uma escrita clara e objectiva, Barroso demonstra que existe apenas a opinião publicada e não a opinião pública. Este facto deve-se à influência social, cada vez maior, exercida pelos meios de comunicação sobreviventes – estes prevalecem, sendo mais fortes e poderosos, porque se movimentam nos meandros do poder, com total descontracção e segurança, mistificando e substituindo a opinião pública, no embalo de uma moral adoptada pelas massas, de forma ingénua e colectiva, logo, legitimando o real adulterado, mas aceite pelas mesmas.

    O discurso jornalístico não se pode deixar comprometer, devendo ser a “mediação desinteressada do real”, fruto da visão neutral dos acontecimentos, correctamente mediatizados. Barroso lembra ainda que, neste âmbito, a opinião pública é substituída, no plano simbólico, por outras formas de opinião – e, aqui, acrescentamos a correlação deste aos planos do imaginário inconsciente.

    Fala depois na utilização jornalística de sondagens que partem do pressuposto de que existe consenso, a partir da questão colocada, como se não existisse outro tipo de problemáticas de real importância, para além daquela. É que, quanto maior for a desagregação social das massas, resultante da ausência de coesão por instinto, maior se torna a necessidade de serem e de se sentirem estimuladas por “interesses e motivações publicitárias”, isto é, pela mais descarada propaganda antidemocrática.

quinta-feira, 1 de agosto de 2019

DE TANTO SOPESAR


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                 De tanto sopesar sonoridade
                 no rumor dos tais versos circunscritos
                 dou por mim inventando na cidade
                 a frescura dos ventos nunca ditos

                 “Em nome da Terra só por verdade
                 perora Vergílio* nos seus escritos
                 que dizer dos caminhos sem idade
                 que só somam despojos e detritos

                 Um cavalo de crinas ondulantes
                 é belo sem selas nem distintivo 
                 galopando liberdades impantes

                 correndo sem saber por que motivo
                 o desejo vacila nos errantes
                 sintomas de sentir ser um ser vivo

*Vergílio Ferreira (1916-1996) – Um génio da Literatura Portuguesa; Prémio Camões (1992).