“(...) as criança de hoje, habituadas que estão a crescer sozinhas, no seio da abundância material, da indiferença dos adultos, longe das normas e de um quadro equilibrado de valores morais e éticos, farão amanhã parte de um mundo onde prevalecerá o egoísmo mais fechado, o arbítrio mais indiscriminado, o capricho mais tenaz, a tirania mais intolerante, vindo os nossos netos a sofrer na carne o tratamento ditatorial e frio de quem nunca aprendeu, soube, ou foi capaz de amar” (M. B. Santos, 1994, in Notícias da Educação, n.º 7, p. 3).
A criança de hoje pena numa “(...) sociedade que nos impõe, em tempo real, a omnipresença das TIC, às quais se ligam os indivíduos de forma viciante, dependente, ambígua, desprovida de lógica, de verdade e de emocionalidade, porque de virtualidade se trata. Fica, por um lado, diluída a territorialidade em nome da globalização, da mesma forma que vamos sendo invadidos por uma espécie de uniformização dos contextos, dos cultos, das crenças, dos ritos e das assunções, a caminho da solidão virtual, do isolamento, da formatação padronizada geradora do pensamento único, na vacuidade do tempo e do lugar; por outro lado, tal estado de coisas potencia a confusão mental ou mesmo a dissociação, disfuncionando o equilíbrio do self “ (M. B. Santos, 2015, in As Cores da Alma, Romance, p. 121).
E tudo continua a ir de mal a pior: a obsessão do digital tem coarctado o crescimento emocional das crianças e dos jovens; tem impedido o desenvolvimento da vertente humana da mente; tem embrutecido o sujeito, impedindo-o de se relacionar empaticamente, por isso, tem aumentado o bullying e o ciberbullying. Sem competências emocionais devidamente trabalhadas, a criança não faz amizades e passa a agir de forma reptílica, profundamente primária; torna-se intolerante e agressiva, incapaz de avaliar e de decidir sobre a linguagem do fácies dos pares.
Perante todos estes sinais de alarme – em 1994 já era tarde –, escutamos dos impreparados eleitos, a narrativa irracional da glorificação do digital... Sim, sim, nas escolas, a toda a brida! Pena é que não seja como parte integrante e útil de um conjunto alargado de actividades diversificadas, onde a necessária e mais importante componente lectiva da escrita com lápis ou esferográfica deva ser ensaiada no papel, com a mãozinha de cada um, a par da leitura feita em livros concretos e palpáveis, sem esquecer todo o tipo de experiências no campo do exercício físico e das áreas de expressão.
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