Temos
trazido, por várias vezes e com a devida vénia, a este nosso fórum – “Angulus
Ridet”, o neurocientista e grande sábio português, António Damásio,
pela pertinência e profundidade dos seus ensinamentos. Hoje, para o assunto que
nos interessa debater, faremos alusão à consciência alargada. Para este
cientista e investigador, os organismos humanos atingiram o seu mais alto grau
de excelência mental, graças à consciência alargada. Desta forma, são capazes
de empatia, reciprocidade, altruísmo; conseguem valorizar a vida, distinguir o
bem do mal, destrinçar a verdade da mentira, entre outras coisas. Acima de
tudo, conseguem colocar-se acima dos imperativos das vantagens e desvantagens da
sobrevivência, e esforçam-se na busca da
verdade no âmbito da análise objectiva dos factos, isto é, são dotados de consciência
moral (Damásio 2010, p. 277).
Segundo escreve este mesmo autor, na
página 278, tudo se processa conforme este encadeamento: “o proto-self é gerado
pela sinalização não consciente de um organismo individual, que consente o self
nuclear e a consciência nuclear, donde advém um self autobiográfico
que leva à consciência alargada, o que desemboca na consciência
moral”. Ver, neste blogue, o escrito que desenvolve o conceito de consciência
moral, devido à importância desta no desenvolvimento
civilizacional – tendo sido este possível, graças à evolução da linguagem, o
que permitiria a sua forma mais admirável, ou seja, o diálogo com o outro. Por
isso referimos o encadeamento de que nos fala Damásio. Não é simples.
Muito menos, quando estamos perante
hierarquias de poder, estratificadas pelas teias organizacionais de grandes
empresas, onde as ordens, veiculadas do topo para a base da pirâmide
empresarial, e, portanto, filtradas pela virtualidade do pensamento, vão sendo
imbuídas por um conjunto de subjectividades intrínsecas aos vários indivíduos
que formam a cadeia de transmissão do poder em causa... já para não falar das
patologias do carácter daqueles. Isto significa que quem tem de obedecer, na
base da pirâmide, está sempre sujeito, inelutavelmente, a uma espécie de
variabilidade desconcertante que é inerente aos comportamentos sociais.
Muito menos ainda, quando, como
acontece neste deplorável século XXI, as relações laborais se encontram eivadas
de artificialismo, virtualidade omnipresente, omnisciente, omnipotente, e
plástica envolvência; é que se esfumou já o universo simbólico da palavra e,
portanto, o indivíduo regrediu para estados arcaicos de interacção doentia;
onde a teia relacional hierarquizada vai assumindo contornos persecutórios,
vorazes e delatórios, acentuadamente tóxicos, alimentando-se do sangue jovem
daqueles que se sujeitam a trabalhar a troco do miserável ordenado mínimo
nacional, num clima de permanente precariedade, insegurança, chantagem e jogos
sádicos, eminentemente insidiosos, onde se verificam aniquiladoras investidas
de “bullying” laboral ou assédio moral, cujos relatos testemunhais
escutamos amiúde, no quotidiano.
Mas insistimos em falar de estado de
direito democrático, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de saúde,
educação e cultura, de direitos laborais, de emprego, de Constituição... quando
sabemos que tudo isto é incompatível com a irracional autofagia da
virtualidade, da desregulamentação dos mercados, da mundialização, da
globalização, do liberalismo absoluto, das trans e multinacionais, notoriamente
comprometedores, todos eles, do elevado nível atingido pelas faculdades mentais
dos indivíduos, ferindo de morte a frágil consciência moral,
paulatinamente aferida pelas criaturas civilizadas...
Nota: Imagem do Google