sexta-feira, 20 de março de 2015

"VOANDO NAS ASAS DE UM POMBO VERDE" - HELENA OSÓRIO


Imagem do Google


1º romance de Helena Osório

O COMENTÁRIO BREVE de: Manuel Bragança dos Santos

            Ocupei a manhã do dia de hoje (18-03-2015) com a leitura atenta e interessada do primeiro romance – “Voando nas asas de um pombo verde” –, escrito por Helena Osório (Angolana, de Benguela). A obra, de trezentas e poucas páginas, agarra o leitor, através da narrativa cuidada, dinâmica, assertiva, viva e colorida. O texto referencial aponta para uma temporalidade estendida e distendida (entre 1917 e a actualidade), de forma engenhosa, cuja definição significativa gira em torno, fundamentalmente, das personagens Cândida, Ângelo e Rosa – sendo esta a filha de ambos. Os três alicerçam todo o desenrolar da intriga, numa organização literária com carácter veemente e transformador, onde se impõe a articulação comedida dos aspectos descritivos e narrativos.

            Helena Osório consegue, na agitação útil do sintagma, o saudável delírio trepidante do seu próprio discurso. E chama-nos à razão, no âmbito da sua explanação teórica e conceptual, para as representações mentais inerentes a um certo contexto histórico e ideológico (1.ª Guerra Mundial; Angola, enquanto realidade sedutoramente redentora e envolvente, tendente a mitigar o redutor desconchavo da 1.ª República; e... a barbaridade da “descolonização exemplar”, do pós 25 de Abril de 1974), balizados pela temporalidade (cronologicamente escalonada no início de cada capítulo) atrás referida, isto é, de 1917 a 2013.

            Em toda a obra perpassa um discurso fremente, arrebatado, agradavelmente absorvente, cuja narrativa, por isso mesmo, se encontra imbuída do ritmo, cor e incidência necessários, de resto, indispensáveis à arte de contar. No caso concreto deste primeiro romance da escritora, esses ritmo, cor e incidência chegam, por vezes, a expressar uma notável intensidade dramática, plasmada no enunciado discursivo, através da sua magoada sensibilidade criativa, tendo em conta os factos e vivências que a prenderam e inspiraram.

            Este livro de Helena Osório insinua-se, perante o leitor, não só devido à sua subtil tonalidade poética, mas também por conter o maravilhoso condão de nos aportar uma extraordinária mensagem de amor e humanismo, arquitectada com mestria na emaranhada tecitura do discurso  narrativo; consegue, assim, operar uma espécie de interacção com a história que conta, obviamente, sem esquecer as nuances entre o tempo da história e o do discurso; a forma como interpreta a história e, por último, o tipo de discurso a que lança mão e que resulta nesta obra extraordinária de denúncia e revolta.

            Atentemos, uma vez mais para a temporalidade da narrativa. Repare-se que a mesma é, sequencialmente, dual, ou seja, a um tempo, significado e significante, emergindo daí realidades diferidas que transmigram um tempo num outro tempo, numa elaboração estética refrescante. A história tem o seu início em 1917, estruturando-se em várias relações temporais dinâmicas, de cariz possível, ao longo de toda a diegese, com recurso sistemático a  analepses e prolepses, de resto, muito bem contrabalançadas pela anacronia que se lhes interpõe, sem que aquelas, no entanto, comprometam a percepção da consciência temporal, isto é, não precipitando ambiguidades entre o passado, o presente e o futuro da acção.

            Um outro aspecto curioso, prende-se com a postura omnisciente da autora, enquanto narradora ausente como personagem da acção, não deixando de ser analítica do ponto de vista interior e, de uma perspectiva meramente exterior, assume-se como uma muito atenta observadora, na óptica da sua exegese, mesmo não sendo, como a própria refere na Nota Final: “ (...) o espírito que inicia e encerra a narrativa”.

            Por último, achamos oportuno fazer uma referência à mensagem bíblica inicial a que Helena Osório recorre: “Somos irmãos”. Carl Gustav Jung alude à reminiscência da primitiva indiscernibilidade entre o sujeito e o mundo exterior. Aquela encontra-se no âmago da identificação social à qual se liga, pressupondo que a psicologia de um indivíduo é igual à do seu irmão, existindo uma validade geral dinâmica, logo, o que é bom para mim também o é para os outros, e o que é imoral para mim sê-lo-á para os outros também. Nesta medida, a identificação através da atitude social consciente reflecte o seu apogeu no ideal cristão do amor ao próximo... Porque “Somos irmãos”.

            Parabéns, Helena! Um abraço do Manuel Bragança dos Santos.

1 comentário:

  1. Parabéns à Helena Osório e muito êxito com o seu romance.
    Um beijo, amigo.

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