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O
signo linguístico “tabu” evoca, necessariamente, um referente cuja
representação mental deve ser imediatamente censurada, diluída, apagada,
desistindo o indivíduo de prosseguir a sua linha de raciocínio, já que de tabu
se trata. Sendo assim, estaria acabado o escrito e o resto da folha
permaneceria imaculadamente branca, pura, misteriosa, mágica, divinizada. No
entanto, o título em epígrafe refere outras coisas, e, portanto, vamos arriscar
reflectir um pouco mais sobre o assunto.
Segundo o Dicionário da Língua
Portuguesa (Porto Editora), de 2006, pode ler-se que tabu é – 1
Religião – um “sistema de interditos religiosos aplicados a determinadas
entidades (seres, objectos, etc.) e atitudes consideradas sagradas ou impuras; 2
interdição social ou cultural implícita de abordar determinados assuntos ou
adoptar determinado comportamento; 3 [ fig.] aquilo que não é discutido
ou mencionado por pudor ou educação (...) (Do
mal. Taáb, “sagrado; proibido”, pelo ing. taboo, “id.”)”. Já o médico alemão Friedrich W.
Doucet (1972), refere o signo polinésio tapu, isto é,
“proibido”. Feito o esclarecimento, resta dizer que a palavra é oriunda do
malaio, mas radica no javanês, tendo sido os ingleses, alegadamente, a adocicar
o seu sentido fónico essencial (accent).
Voltemos a Doucet: este
cientista afirma que, na Polinésia, os autóctones cultivavam uma representação
religiosa primitiva, relacionada com certos objectos e pessoas intocáveis,
devido ao poder e força psíquicos de cariz mágico (mana), ou seja, o
poder mágico ou demoníaco dos espíritos naturais. Recordamos, a propósito, a
espécie de poder mana de que gozavam os padres, professores e médicos no
regime do Estado Novo – grosso modo, ao longo das décadas de 1930, 40, 50, 60 e
parte de 70, em Portugal... E os políticos?! Sim, também! Embora enquadrados
num clima muito mais potenciador de ambivalência, que foi abrindo caminho à
resistência e à revolta.
Mas, para os polinésios, também as
parturientes e as menstruadas constituíam tabu sexual, o que levou Freud a
estabelecer um paralelismo entre aquelas e os sintomas da neurose compulsiva.
Assim, apontou como fundamentos a origem dos rituais e normas que revestem o proibido; a dinâmica e o perigo
de contágio do proibido; a valorização deste por imperativos intrínsecos; o
desprazer inerente à proibição. Isto significa ainda que o tabu impede a
inconsciente transgressão dos limites, mas deixa nos indivíduos uma sensação de
ambivalência, de forte desejo recalcado de prevaricar. Por isso é que Adão
levou Eva a morder a maçã – Freud, na publicação “Totem e Tabu”,
fala no poder mágico do contágio que o tabu exerce.
Já Jung, um empirista da
psicologia analítica, na obra “Relações entre o Inconsciente e o Consciente”,
vê o tabu como algo capaz de defender o psiquismo do indivíduo, reforçando a
consciência e o ego, pelo que importa banir todos os obstáculos que tolham o
desenvolvimento de personalidades fortes, equilibradas e diferenciadas, logo,
prestigiadas, e alerta para o risco de fazer perigar a sua vida em sociedade,
pela “perda prematura de prestígio, através da invasão operada pelo psiquismo
colectivo”, de natureza transgeracional. O prestígio, aqui, deve ser
interpretado como uma espécie de encanto mágico e carismático de determinadas
personalidades, que a massificação compromete; por isso importa a manutençao do
segredo incondicional, do tabu, para a protecção das qualidades
individuais.
Por último, encerraremos a presente
reflexão com uma breve alusão à existência, na sociedade lusitana actual, de
alguns tabus a saber: o silêncio de certos políticos, o sigilo nos negócios, os
dogmas religiosos, as praxes estudantis, entre outros. Em todos eles impera o segredo
incondicional, a garantir o prestígio dos seus detentores, no fortalecimento e
diferenciação das suas personalidades e respectivos estatutos e papéis, de
forma a possibilitar a afirmação da defesa dos seus interesses incontornáveis,
através do exercício incontestado do poder que lhes convém manter inalterado.
Mas é por isso mesmo que há quem os admire e siga.
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