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NOTA PRÉVIA: Os textos des-criptos (I
& II) são dedicados a quem acontece nascer...
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Não é tarefa simples escrever sobre
a qualidade do vínculo do bebé à mãe e sobre a entrada na adolescência, nem
muito menos tentar fazê-lo ao longo de meia dúzia de parágrafos. Ainda assim,
vamos tentar esboçar um conjunto integrado de ideias sobre o assunto,
procurando lançar alguma luz sobre esta matéria, cada vez mais candente e
problemática, nos dias que correm, fundamentalmente, devido ao crescente
alheamento e imaturidade dos progenitores, tendo em conta os seus
comportamentos atitudinais eivados de incompetência e irresponsabilidade.
Nesse sentido, convém recordar,
desde já e de forma sintética, que a criança recém-nascida tem absoluta
precisão de manter com a mãe um vínculo saudável que lhe permita a gradual
aquisição da consciência de si e da unidade do seu corpo, num clima seguro e
emocionalmente gratificante, integrando aspectos identitários do self e dos
objectos externos, para, assim, ir construindo, paulatinamente, a devida
autonomia no seio da família, como viu Melanie Klein. Aliás, esta
funcionalidade será modelar para as futuras relações sociais, segundo Freud,
Adler, Lorenz, Zimmerman, Bowlby, e outros.
Este tipo de relação psicodinâmica,
que Winnicott designa de holding environment, reforça a afectividade e o
conhecimento, e promove a autonomia, e, ainda no dizer de Klein, desenvolve
defesas contra a ansiedade persecutória, preparando o bebé saciado e tranquilo
para a relação de objecto. Ora, as relações objectais abarcam, não só o
universo (consciente) pessoal do sujeito, mas também os seus objectos internos
(inconscientes). Neste ponto, Klein alerta para a dependência excessiva da mãe,
muito embora o amor desta possa sanar a relação; o mesmo não se pode dizer da
fixação do sujeito a uma certa avidez lactente – quando tal acontece –,
deformadora do ego e fatal para a estruturação da personalidade (cisões egóicas
e desligamento), porque recusa o objecto e procura apenas satisfação.
Nesta
sequência relacional, salientemos as teses de Wilfred Bion – é fulcral a sua
visão de toda esta problemática, quando o mesmo refere a interacção continente
(mãe)-conteúdo (bebé), através da identificação
projectiva (Klein)
e da relação dinâmica
entre as posições esquizo-paranóide e depressiva (Klein), donde resulta a
formação do aparelho para pensar os pensamentos, ou seja, são os pensamentos
que produzem a actividade de pensar. Nas relações frustradas e frustrantes pode
haver uma perturbação na progressão dos pensamentos ou no estímulo exercido por
estes no psiquismo do bebé (aparelho para pensar os pensamentos) ou em ambos os
processos.
Assim, a criança
constrói o seu processo identitário e a sua estrutura psíquica, projectando na
mãe (rêverie)* as suas angústias, medos e emoções, a seguir “lavados” e
introjectados, sendo inerente a este fenómeno um conjunto de reacções
somato-psíquicas que envolvem Amor (Love), Ódio
(Hate) e Conhecimento (Knowledge)
– L; H; K. Não há emoção sem relação, sendo estas relações
iniciais que preparam o futuro social das interacções objectais adultas.
Mas Bion vai mais longe e analisa a
relação de per si, apontando a possibilidade de “ataques aos vínculos”,
isto é, a mãe pode não conseguir albergar os sentimentos do filho ou, então,
pode o bebé, por (H) ódio ou inveja, impedir o
papel metabolizador da mãe, frustrando o (K)
conhecimento; tanto num caso como no outro está comprometida a relação de (L) amor, a aprendizagem e o desenvolvimento. Estas
situações configuram, por um lado, uma identificação projectiva patológica,
onde prevalece uma inata baixa tolerância à frustração; segundo Grinberg
(1973), ocorrem fantasias omnipotentes (defesas) passíveis de dissociar partes
do Eu e dos objectos internos, projectados e controlados na mãe; por outro
lado, a identificação projectiva saudável, gera boa tolerância à frustração
e padroniza todos os vínculos e relações de empatia, comunicação e compreensão
dos afectos projectados... aprendizagem utilíssima pela vida fora.
Ainda que Freud tenha oposto o
princípio do prazer ao da realidade; mesmo que Klein faça depender o
desenvolvimento do bebé, da capacidade de amar da mãe; considerando até que
Bion aponta a estagnação mental e a
loucura, como resultado das perturbações relacionais verificadas entre a mãe e
o bebé, na prática, tudo se resume à sucedida abrangência emocional partilhada,
sempre imbuída de afectividade sadia, para que a relação dinâmica possa gerar
conhecimento a partir da experiência íntegra vivenciada, isto é, vinculando o
sujeito à verdade, ao invés de o lançar nas malhas da dor mental, da angústia,
da frustração ansiosa, como quando o bebé destila inveja e voracidade.
* Rêverie – Sensação
gratificante, vivenciada no limiar da vigília e do sono.
Referências bibliográficas:
Dias, C. A. & Fleming. M. 1998. A Psicanálise em Tempo de Mudança –
Contribuições teóricas a partir de Bion. Biblioteca das Ciências do Homem.
Edições Afrontamento. Porto.
Fleming, M. 1993. Adolescência e
Autonomia – O desenvolvimento psicológico e a relação com os pais.
Biblioteca das Ciências do Homem. Edições Afrontamento. Porto.
Grinberg, L. (1973). Introdução às ideias de Bion.
Imago. Rio de Janeiro.
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