quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

LUGAR AO SONHO


No dizer de Pierre Mabille (1904-1952), “o Maravilhoso exprime a necessidade de ultrapassar os limites impostos pela nossa estrutura, de atingir uma maior beleza, um maior poder, uma maior duração. O Maravilhoso visa superar as barreiras do espaço e do tempo; pretende destruir todos os obstáculos. Ele é a luta da Liberdade e é contra tudo o que a reduz, destrói ou mutila”.

“(...) O Maravilhoso aproveita-se dos pontos de fraqueza da inteligência organizadora, como o fogo de um vulcão se insinua entre as falhas da rocha; ele ilumina os celeiros da infância, é a estranha lucidez do delírio, é a luz do sonho, a claridade verde da paixão...”.

Depois de analisada, com a devida atenção, esta pequena mas deliciosa explanação de Pierre Mabille, relativamente ao conceito de Maravilhoso, sou levado a concluir o quão arredados temos andado todos das necessidades mais prementes das crianças, neste particular, devido à falta de informação inerente a este tipo de matérias, o que redunda, na prática, num tremendo vazio relacional, ao nível de uma certa contextualização que deveria, na prática lectiva diária, consubstanciar um enquadramento (ensino/aprendizagem) de eleição.

Já lá vai o tempo em que as crianças – como se passou comigo – cresciam na doce envolvência das famílias alargadas, isto é, aquelas que incluíam os avós e/ou os tios, quando tal se verificava, claro, e podiam usufruir, conforme referi já num escrito anterior, de um sem número de situações nas quais, a talho de foice, os avós, sempre adorados e respeitados, lhes iam contando todo o tipo de histórias, de cantilenas e lenga-lengas, de contos, enfim... Certo dia, a avó Albina, perante a insaciável curiosidade dos netos, já estafada, disparou de mansinho: “tenho um saco de cantigas / e mais uma taleigada / mas se hoje as canto todas / amanhã não canto nada”.

Que resta hoje às crianças, na prática, que lhes permita encetar a fabulosa, apaziguadora e edificante viagem pela aventura do sonho, nas asas mágicas do maravilhoso, rumo ao incrível universo do seu próprio imaginário?! Que ponte conceptual estará o actual sistema educativo disposto a colocar ao serviço dos meninos e das meninas deste país, no seio do mais legítimo contexto de sala de aula, a partir das condições que urge criar, no sentido de derrubar as nefandas barreiras existenciais que se deparam ao normal desenvolvimento de todas e de cada uma das crianças que, com toda a naturalidade, demandam o ensino dito pré-primário?! (CONTINUA)

Imagem do Google


1 comentário:

  1. Querido Ze
    Felizmente,ha locais onde as crianças da pre-primaria tem acesso a livros, que trazem para os pais lhes lerem ao serao! No meu caso, para a avo ler...
    O que seria das crianças se as privassemos da capacidade de sonharem?!
    Parabens pelo texto.
    E preciso «abana» certas consciencias.
    Beijinhos
    Mana

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