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Por
simples ousadia ou por mero acto cívico, tentaremos discernir sobre o perfil
ideopsicológico do estratega Oliveira Salazar (1889-1970), recordando aqui uma das mais polémicas e interventivas personalidades
históricas, do Portugal do século XX. O mentor desta nova estratégia terá
elaborado a sua doutrina a partir de um conjunto de ideias do fascismo italiano
(inspirado em Charles Maurras [1868-1952]) e do catolicismo mais primário e retrógrado. Tal
como em Itália, o Governo apoiou-se na burguesia, contou inicialmente com a
protecção militar e com a ampla e sempre crescente influência da Igreja, cujo
autoritarismo monolítico inveterado obstou a qualquer alteração da própria
sociedade.
Salazar apresentava-se como um
espírito atento mas fechado, pouco conversador mas capaz de, em cada discurso,
enviar uma infinidade de recados a todos quantos o quisessem ouvir;
assumidamente puritano, dizia-se católico praticante e homem de convicções
profundas, as quais obviamente cultivava. Ele próprio, no ano de 1954, durante
uma entrevista, afirmou não acreditar no sufrágio universal, nem na igualdade,
mas sim na hierarquia.
Os estudos não conseguiram diluir
nele as marcas de um provincianismo enraizado que o impediriam de desejar
conhecer o mundo para lá das fronteiras do Portugal Europeu. Ele permaneceria
no seu país e daria o peito a todas as investidas do “mal” que, do exterior,
espreitasse minar a pacífica dolência da terra lusitana. Qual eleito, ungido
por Deus, colocaria todas as energias da sua alma, do seu carácter férreo,
inabalável e do seu trabalho aturado, incansável, ao serviço de Portugal, tal
como ele o viria a conceber.
Nesta medida, Salazar procurou o
apoio de homens que ele considerava como sendo os que melhor lhe convinham: os
grandes latifundiários e outros proprietários, as patentes militares elevadas e
influentes, os bispos, a alta finança nacional com conexões britânicas e ainda
alguns comerciantes das cidades portuguesas de referência, como o eram Lisboa e
Porto.
Estava, desta maneira, estruturada a
equipa que conseguiria manter, ao longo de algumas décadas, camponeses,
operários e restante população, mais ou menos controlados, mais ou menos
submissos, nem que para tal fosse necessário accionar algumas medidas
repressivas ou mesmo forjar resultados eleitorais, sempre que estes tivessem
lugar.
De forma calculada e paulatina,
Salazar foi levando a água ao seu elaborado moinho, a partir daquela que seria,
desde logo, a sua primeira preocupação: o equilíbrio das contas nacionais, se
possível e preferencialmente, à custa da maioria dos portugueses, sem beliscar
o interesse da minoria que o apoiava. Procedeu à subida dos impostos e à
descida dos salários reais, acompanhadas pela debilitação dos serviços sociais.
O povo foi sendo cada vez mais espoliado pela máquina fiscal, enquanto que
alguns sectores-chave da economia conseguiam notório desenvolvimento,
principalmente aqueles que beneficiavam do fluxo de capital estrangeiro. Esta
política aparentemente útil foi degradando os restantes sectores como era o
caso da agricultura. Portugal "crescia", mas não se desenvolvia, não
progredia, distanciando-se do resto da Europa. Em meados do século XX, a massa
de analfabetos cifrava-se nos 40%; a meio da década de sessenta, embora o
sector primário absorvesse cerca de 35% dos braços activos, tal esforço apenas
se traduzia em um quinto do produto nacional bruto.
A verdade de tudo isto saltava à
vista através da sangria terrível que constituiu a emigração. Para fugir à fome
e à miséria que o desemprego provocava, na primeira metade dos anos sessenta,
270.000 portugueses tentaram a sua sorte em vários países Europeus, enquanto
que 60.000 optaram pelas colónias, nomeadamente Angola e Moçambique. A despesa
com estas era também insustentável, uma vez que, a partir de 1968, o MPLA foi
conseguindo apoio bélico internacional cada vez mais sofisticado e destruidor, com
funestas consequências para a juventude masculina em flor, que para essas
paragens tinha sido ultrajantemente empurrada.
Em
conclusão, diremos que entre 1960 e 1970 terão emigrado um milhão de almas. O
regime gangrenava. A História, por vezes, repete-se, não em todas as suas
vertentes e nuances, claro, mas confinadamente a certos aspectos deploráveis da
governação que, em resultado de uma primeira análise, seriam naturalmente de
evitar ou contornar, em nome do mais puro e elementar bom senso. Ontem como
hoje. Enfim!...
Nem gosto de lembrar esse tempo nem esta personagem...
ResponderEliminarMas gostei de o ler.
Beijos.
Olá, Humberto
ResponderEliminarHá muito tempo não passava por cá porque tinha perdido o seu endereço.
Como estive um ano fora do blog para poder concluir o meu 2º.livro, o meu computador fez um "looping" :) e perdi alguns contactos. Agora estive no blog da Beatriz e vi-o lá. Resolvi por isso fazer uma visitinha.
Por coincidência recebi hoje um documento muito completo acerca da vida e obra de Salazar. Ainda não o li todo porque é bastante extenso, mas guardei-o para análise futura. Interesso-me muito por História, e é mais nesse aspecto que hoje vejo Salazar do que à luz da política.
Gostei de ler a sua postagem.
Não que aparecer pelo meu cantinho? Já tenho saudades de o ver por lá.
Um Domingo feliz
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS