No
dia 3 de Julho de 2020, nos canais televisivos da nossa
rectangularidade europeia, veio a lume a notícia de teor
espectacular, especular, escandaloso, demencial, do incesto
perpetrado, a meio da noite, por um sujeito alcoolizado, na pessoa de
sua mãe, de sessenta e tais anos de idade, tendo o acto
configurado, alegadamente, a violação consumada. Só
devido a este aspecto particular, o filho terá de responder
perante a Lei, uma vez que o incesto consensual (+ 18 anos) não
constitui um ilícito criminal, de acordo com a lei portuguesa,
de resto, como acontece na Natureza.
Segundo
os entendidos na matéria, trata-se de uma ligação
entre familiares, de cariz sexual, mais vulgar do que seria de
esperar, sendo, aquela a que se alude no primeiro parágrafo do
texto, a de mais rara concretização, tal como ocorreu
entre Édipo e
Jocasta, na
tragédia Édipo
Rei, de Sófocles.
Não tão raro mas, ainda assim invulgar é o
incesto praticado por irmãos, e aqui recordamos o amor de
CarlOS
da MAIA(S)
e Maria Eduarda, (re)criado
por Eça de Queirós.
Já o mais usual – releiam o conto A
Princesa Pele-de-Burro
–, mesmo que, aqui e ali movido de forma inconsciente, condensada,
avessa, compulsiva e mórbida, é o incesto entre o pai
frouxo, imaturo e a filha que é levada, a contra-gosto, a
ocupar o lugar da mãe, como acontece no romance de M.
Bragança dos Santos,
“As Cores da Alma”,
com as personagens Marcelo e
Agripina.
Contudo,
no caso dos irmãos, acontecem, por norma, as curiosidades
sexuais-pré-genitais, os esboços lúdicos
(passageiros) de reciprocidade proto-erótica, não
devendo estes descambar em viciação-fixação.
Estas manifestações de sexualidade pré-pubertária,
com a idade, evoluem, rapidamente, depois das pulsões parciais
infantis terem dado lugar à genitalidade normal,
definitivamente configurada, maturada, no âmbito da relação
objectal, onde tem de prevalecer a sensualidade, que o desejo sonda,
fora do corpo do próprio.
Caso
contrário, se, no devir cronológico da adolescência,
o sujeito mantiver uma fixação às pulsões
parciais, manter-se-á estagnado, sem resolução
edipiana nem ganhos super-egóicos, no domínio da
perversão auto-erótica, na pré-genitalidade, não
sendo capaz de crescer afectiva e emocionalmente, não
conseguindo nunca lidar com o real do sexo, nem com os outros. Assim,
comprometerá a sua identidade, individuação,
afirmação, autonomia, inserção e
pertença. Conforme Lacan
afirmou nos primeiros anos de 1960, o sujeito deve, a um tempo,
sentir a necessidade de inclusão e separação,
para ser quem é; não permitindo que o ego
seja joguete das exigências do id
ou das cedências do superego;
furtando-se a cavar a infelicidade daqueles com quem se relaciona
doentiamente, como no incesto noticiado no dia 03 de Julho de 2020.
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