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Por
muito que se não queira; ainda que se ignore; mesmo que se diga o contrário, na
esmagadora maioria dos casos, sempre que duas pessoas interagem, tentam sempre
levar a melhor uma sobre a outra, de forma deliberada ou subliminar,
protagonizando esse tipo de relação tão caracteristicamente humana, tão
intrinsecamente própria do chamado “rei” dos animais, tão inerente ao
âmbito das sofisticadas “qualidades” desse predador único e
insubstituível, que se tem encarregado de, no decurso dos anos, laboriosamente,
ir destruindo, sem contemplações, esta nossa única, e também insubstituível,
casa planetária.
Este género de necessidade primária,
que a educação e o verniz social tentam contornar ou diluir, pode tanger, por
vezes, o limiar do doentio, e, manifesta-se, como é evidente, muito mais em
certos indivíduos, pelo que se faz sentir com menor acuidade em outros que não
aqueles. Por outras palavras, podemos afirmar que existem certas almas, porque
a excepção só vem confirmar a regra, dotadas de espírito nobre, de capacidade
solidária, altruísta, de sentido de justiça, de visão empática das diversas
situações vivenciais, de equilíbrio emocional e afectivo, moral, ético e
social, enfim, ainda vai havendo quem assim seja.
Não é, no entanto, destes poucos
eleitos que pretendemos falar. Não, pelo contrário, a nossa intenção, hoje, é
discernir um pouco a respeito dessas minorias que, integrando a maioria das
pessoas que, salvo informação contraditória, com urgência comprovativa, tudo
fazem no sentido de levar a água ao seu moinho, como é o caso dos senhores que
se pelam pela detenção continuada do poder político e/ou aqueles outros que, de
forma afanosa e obcecada, vendem a alma ao Diabo só para aumentarem até aos
limites irracionais do inútil e do impossível os lucros dos seus impérios
financeiros especulativos, doa a quem doer, custe o que custar, por cima de
quem quer que seja, nem que para tal tenham de transformar a própria sociedade
num imenso rebanho amorfo de seres desprovidos de vontade, de valores, de
princípios e de capacidade de sonhar.
Pois
é, o poder económico e o político, quantas vezes da mãos dadas e outras tantas
de candeias às avessas, tudo apostam visando o domínio dos pobres coitados dos
cidadãos ditos de pleno direito (?!), com o fim claro e definido de deles se
aproveitarem, para que tudo o que eles são e representam em termos de votos e
ganhos remuneratórios possa acabar por reverter, de forma rápida, para os
interesses e bolsos desses dois famigerados grupos de “estrelas”, onde
pontificam excepções, como está bem de ver. Importante mesmo é cortar cerce, à
nascença, a capacidade de sonhar de que todo o ser humano é dotado. Como fazê-lo?
Nada melhor do que recorrer a certos
“media”, da forma mais expedita possível, fazendo apelo às mais primitivas,
rasteiras e inconfessáveis tendências “animalescas” do ser humano, colocando-o,
sem que ele tão pouco se dê conta, na engrenagem maquiavélica das audiências às
quais respondem e correspondem surdos desejos recalcados, de sexo, violência,
ódios, vinganças e outras chafurdices deploráveis. É isso: nada melhor do que
levar o incauto cidadão ao consumismo exacerbado de doses maciças de imagens
calculadamente urdidas, numa alienação abominável em proveito do objecto
contemplado, ao sabor da eclosão da sua própria actividade inconsciente. E
ei-los que se deliciam, sem razão aparente, nas imagens dominantes da
necessidade, robotizados, anestesiados, devorando o pasto verde e tenro das
audiências, comprometendo a razão de atribuição e uso desse filtro racional
secundário indispensável a qualquer situação de vida tendente a ser analisada
primeiro e decidida depois.
Somos dotados de inteligência, de
raciocínio, mas as imagens que nos esmagam no quotidiano, subvertem e impedem
que atribuamos significação consciente e plausível às mesmas, para que delas
partamos para o necessário recompletamento do universo imaginário dos sonhos de
que, o simples mas construtivo acto de ler é exemplo paradigmático.
Os “media” - certos “media”
- constituem hoje uma ultrajante ofensa, uma aniquilante devassa, uma
despudorada intromissão de lesa dignidade pessoal e social dos indivíduos que
deles não conseguem furtar-se. Como escrevemos num artigo recente: “eles,
“media” (os que o fazem), “governam” pelos governos, “decidem” pelas
instituições, “opinam” pelos cidadãos”, numa escalada de
descaracterização das mais elementares normas da própria democracia que, desta
maneira, pode mesmo correr o risco de vir a enfermar de uma certa debilidade
estruturalizante.
O Rebanho das Audiências
encontra-se já nos pastos do descalabro político-económico e social sem deixar
que ninguém, para já, se consiga opor a quem para lá o lançou e alimenta.
Deparamo-nos com uma sociedade, como o é a portuguesa, toda ela a braços com a
depauperante desconstrução, via “media”, articulada e titerizada pelos
cavalheiros dos poderes económico e/ou político. Se quisermos abrir os olhos,
estaremos sempre a tempo, embora comece a ser cada vez mais difícil remar
contra a maré destes dois oceanos deveras turbulentos, agressivos, implacáveis
mesmo, e extraordinariamente bem orquestrados nas suas motivações e objectivos
(In “O Primeiro de Janeiro” [12/2004]).