terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

A GRAÇA DE SER POETISA



GRAÇA PIRES - POETISA
(Imagem do Google)

    Foi Freud quem primeiro colocou o acento tónico na palavra e no seu poder mágico. É pela palavra, fundamentalmente, que o homem comunica, influencia, seduz ou persegue, fazendo-o de uma forma muito mais eficaz do que qualquer outro ser do reino animal, incapaz de dominar este tão excepcional quanto extraordinário dom. O domínio da linguagem situa e integra o ser falante no seio dos pares, balizando as interacções, doseando as acções, impondo as convenções e disciplinando as obsessões.

    Lacan, outro seguidor de Freud, refere que apenas somos humanos porque falamos, procurando o entendimento através da palavra. Por muito que não se queira ou não se dê conta, declaram estes cientistas, o inconsciente determina muito do que se afirma (Freud) e, Lacan, na esteira daquele, relaciona inconsciente com linguagem, de forma estruturada e estruturante, emergindo ambas as componentes do signo linguístico (significado e significante), por ocasião de qualquer contacto comunicacional.

    Contudo, acrescenta Lacan, a intersubjectividade inerente à troca de mensagens subverte a linearidade e a exactidão desejadas dos conteúdos veiculados, devido aos imponderáveis do inconsciente e à codificação/descodificação do emissor e do receptor e à capacidade de ambos percepcionarem a realidade e procederem à nomeação ou à interpretação da mesma, utilizando a mais ou menos aferida representação mental cujo significado (coisa nomeada) se transmuta referencialmente no significante (imagem acústica).

    Depois desta introdução sobre a linguagem falada, e sem mais delongas, situemo-nos, agora, numa das componentes da comunicação escrita: a Poesia. Esta, expressa-a o homem de forma bem mais sintética, mas muito mais complexa, sem deixar de ser lúdica, musical (rítmica), estimulante e criativa, onírica e essencial, porque sublima sentimentos cativos, vivências frustradas ou não, emoções mal esboçadas ou reprimidas, encantamentos ou delírios, afectos rendidos ou júbilos decantados, sejam eles narcisistas ou dirigidos.

    No entanto, Não é poeta quem quer/nem quem vê na poesia/o nebuloso mister/de tonta sobranceria, conforme escrevemos há tempos. Depois de termos adquirido e lido, repetidamente, o livro de poesia “UMA VARA DE MEDIR O SOL”, da poetisa Graça Pires, decidimo-nos por este pequeno escrito de homenagem à autora, já que ela possui a Graça de ser poetisa, genuinamente criativa e fazedora de algo (poiesis) com valor autoral comprovado, vincadamente estético, sentido, harmónico, numa palavra – inspirado.

    Um último paragrafo para referir que a poesia, entre muitas outras das suas múltiplas cambiantes, se arquitecta através das relações específicas que emergem da interacção estabelecida entre o significado e o significante, e até entre os próprios significados, na forma como se compõe sintagmaticamente cada verso, na senda da violação do código da linguagem dita normativa, embora nada disto seja definitivo, tal como neste livro de Graça Pires, onde a engenharia da palavra é tudo isto e o seu contrário: Regressei com a lentidão de quem vem de longe/do mar com pedras na boca para cuspir nos lugares/onde o vento envolve a gruta das nascentes.(...) – [(Graça Pires, em Uma Vara de Medir o Sol), 2018, p. 23].

Nota: Parabéns, querida amiga.




5 comentários:

  1. Nem sei o que diga, meu Amigo. Sabe que gosto sempre de vir lê-lo. Mas hoje você fala de mim e da poesia, muito mais importante que eu. A linguagem da poesia possui uma energia muito própria com itinerários da memória, não meramente descritivos. Por isso não é Poeta quem quer, mas sim quem sente a poesia como um tesouro que se quer partilhar. Bem- haja por gostar do que escrevo e por mo dizer, assim, desta forma carinhosa.

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  2. Querido amigo Humberto, tinha que ser você, para definir e homenagear tão belamente esta poetisa por quem tenho uma grande admiração e carinho, bem como todas suas obras publicadas, de onde sempre que leio saio inspirado. Eu fico-lhe grato pela inspiração sincera tão bem escrita.
    Parabenizo-lhe por falar por nós sobre Graça Pires.
    Obrigado amigo.
    Meu terno abraço de paz.

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  3. Vi-me aflita para ler, as cores não contrastam devidamente
    e é pela porque está uma excelente homenagem, não só à
    Graça Pires, como à poesia.
    Tendo formação cientifica e habituada a ler poemas de
    grandes mestres, nunca me imaginei a escrever poesia,
    apesar de ter sido muito incentivada, até pelo AReis
    que deixou o comentário supra-citado.
    Em Junho do ano passado, numa decisão momentânea, eis
    que escrevi uma poesia... gostei e não mais parei.
    Sou uma aprendiza, pelo que, os comentários foram um
    importante incentivo.
    Grata pelo apoio.
    Saudações poéticas.
    ~~~~

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